Cumprir penitências e comercializar indulgências climáticas não é um bom caminho...
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro
Em 2024, o poder público brasileiro promoveu uma verdadeira corrida para aprovar projetos de "proteção ao meio ambiente" e de "transição para uma matriz energética mais renovável e limpa". Ao mesmo tempo, o governo protagonizou verdadeiro desastre gerencial, com embates políticos internos, greves infindáveis na agência federal, falhas escabrosas na prevenção e no atendimento a inundações, fiscalização risível no combate à mineração clandestina, desflorestamento em terras indígenas e atingimento de recordes históricos de queimadas e incêndios florestais.
Prisioneiro de um viés ideológico claramente falido, tem-se que a má governança permanecerá em 2025, agora sob lentes menos coniventes da comunidade internacional.
Com esse desastroso histórico, o governo brasileiro pretende assumir uma posição de "vanguarda" ao sediar, em Belém, a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30). Terá que intensificar esforços diplomáticos em um cenário externo desfavorável e arrumar a própria casa para que a COP30 não se transforme no certificado de incompetência absoluta.
A realização do evento em uma cidade amazônica precipita o Brasil no caldeirão globalista da relativização da soberania sobre a região. Entre secas e inundações - riscos de embates bélicos regionais, o papelão de ver seu petróleo ser explorado pelos países vizinhos sem conseguir licenciar a si próprio, o governo brasileiro necessita, ainda, dar contornos reais ao acordo firmado em 2024 - em torno da Nova Meta Coletiva Quantificada (NCQG), que prevê maior repasse de recursos de países desenvolvidos para nações em desenvolvimento, com o objetivo de reduzir emissões e compensá-las por perdas e danos climáticos.
A meta estabelecida, de US$ 300 bilhões até 2035, dificilmente será cumprida. Ademais, a sustentação institucional para se tornar plausível, começa a ruir com o efeito dominó decorrente da saída dos EUA e outros países, bem como de grandes instituições financeiras, do Acordo "termostato" de Paris.
A definição de como o fundo deverá ser operacionalizado pouco avançou até agora. Resta na vitrine, o destaque à aprovação do projeto Combustível do Futuro, com metas para maior uso de etanol, biodiesel, combustível sustentável para aviação (SAF) e biometano. O Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten), de financiamento a projetos de combustíveis renováveis e de baixo carbono, energia solar, biomassa e biogás, será analisado em meio a questionamentos sérios com relação à circularidade dos veículos elétricos movidos à bateria.
A agenda ambiental e a transição energética propostas pelo governo brasileiro, especialmente em relação à COP30, desconsideram premissas fundamentais da economia de mercado, do desenvolvimento sustentável e da soberania nacional.
Segue, portanto, uma abordagem propositiva sobre a questão.
1. Prioridade ao Desenvolvimento Econômico
O eixo central da política é o desenvolvimento econômico. O foco ambiental, sem análise do impacto econômico, compromete setores estratégicos - relativiza a segurança jurídica e operacional necessária à agricultura, mineração, transportes, indústria e energia.
O ambiente internacional é uma miragem que só militantes insistem em não ver... embora hipocritamente a enxerguem. O famoso e alarmista Relatório Stern, que vinculou graves impactos econômicos à mudança climática, completou a maioridade de 18 anos... sem qualquer efeito concreto na matriz econômica do próprio G20. Incrivelmente, o relatório foi "atualizado" em 2023, como forma de manter a pálida chama de um perfil murchado (tal como a letra daquela famosa canção do Procol Harum). Trump reassume o governo nos EUA e "enterra" o Protocolo de Paris, 5 anos após publicada a "carta bipartidária" de economistas americanos, no WSJ, recomendando "ação governamental contra a mudança climática" - sem que, de fato, os democratas tratassem de fazê-lo de fato em todo esse lustro. Por óbvio... a economia ditou o clima das decisões e hesitações - e não o clima a ser "combatido".
O Brasil é um péssimo exemplo no campo da implementação de legislações ambientais rigorosas, concomitantemente com a expansão em escala geométrica de infrações e desequilíbrios em face da demanda social de crescimento. A história recente traça um parâmetro de constante atrito do viés ambientalista com a disposição das atividades humanas no território, e a demanda de um setor produtivo em constante modo de "resistência".
O resultado se traduz, inevitavelmente, em deseconomia, perda de empregos e receitas para o Estado.
Posto isso, é evidente que a autoridade climática do Estado Brasileiro deve permanecer diretamente conectada ao Presidente da República, e sob fiscalização do Congresso Nacional. Não se trata de "tomar para si" um discurso natureba ou "combater o negacionismo". Se trata de proteger a economia da Nação e operacionalizar a Defesa Civil.
2. Intervenção Privada e Iniciativas de Mercado
Metas coletivas de recursos financeiros, como a miragem de US$ 300 bilhões até 2035, no campo climático, além de representar a troca "por algo que se tem... por algo a haver", canaliza esforços de transição sob dependência excessiva de dinheiro público e transferências internacionais. Ademais, relativiza, em cada mecanismo editado sob essa rubrica, a Soberania Nacional.
Em vez de se basear em aportes governamentais, o espaço da inovação deveria se dar com a participação do setor privado e mobilização de bancos multilaterais. Nesse sentido, o Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten), pode ser uma oportunidade para fomentar parcerias público-privadas que gerem inovação, eficiência e competitividade. Em vez de "restrições", o foco deveria ser o investimento e o empreendedorismo. Da mesma forma, o mercado de carbono necessitaria de um ambiente de trocas seguro, que não se envolvesse com regras dúbias de restrição, ou fiscalização redundante - ou seja, a legislação recentemente aprovada, já nasce complicada.
A administração do recém criado mercado de emissões - SBCE pode gerar uma carga burocrática excessiva. A mistura de compliance com critérios elásticos de ESG, termina demandando recursos adicionais para a adequação frente às novas e crescentes exigências regulatórias. Essa complicação pode desestimular investimentos em inovação e eficiência, num momento em que o Brasil precisa atrair capital para auxiliar no crescimento econômico.
Posto isso, liberar o mercado para um sistema mais eclético de certificações e trocas, bem como tornar mais transparente o licenciamento ambiental, possibilitará um melhor diálogo com investidores e menor fuga de capital.
3. Soberania Nacional e Acordos Internacionais
A obrigação generalizada de países historicamente listados e não listados, de financiar iniciativas climáticas, enfatiza a importância da soberania nacional. Patente que o domínio globalista e eurocêntrico do Acordo de Paris, desvia responsabilidades históricas e questiona a equidade da distribuição de recursos. O Brasil, nesse campo, é o "otário" preferencial. Enfrenta pressões desproporcionais em uma agenda global projetada por nações mais interessadas em interferir na gestão dos recursos econômicos brasileiros que, propriamente, "reduzir emissões".
Nesse diapasão, os EUA, ao sair de um acordo que nunca ratificou, aponta justamente essa desproporção como motivo. Enquanto o Brasil, hoje prisioneiro do chamado "globalismo progressista", aceita os grilhões biocentristas como "premio por bom comportamento".
Por óbvio, essa postura subserviente precisa ter fim.
4. Combustíveis Fósseis e Energia
A pauta da COP30 destaca aprovação do projeto "Combustível do Futuro". Esse projeto, em um país com tamanhas reservas de combustível fóssil como o Brasil, jamais poderia ser adotado sem antes analisar nosso comprometimento com a autossuficiência energética. A busca por alternativas sustentáveis deve ser acompanhada da preservação dos setores tradicionais de energia, assegurando não apenas a preservação ambiental, mas também a segurança energética e a estabilidade econômica.
O carvão ainda é fonte crucial de energia em certas regiões do Brasil. A eliminação abrupta de incentivos, como recentemente ocorrida, pode comprometer a segurança energética e o fornecimento em setores importantes, especialmente onde não há alternativa viável à mão de obra e à infraestrutura já estabelecidas.
O petróleo ainda é o sangue que corre nas veias do sistema energético mundial. Abrir mão de sua exploração é ferir a própria soberania nacional. É crucial, portanto, que a transição para fontes de energia renováveis seja gradual e fundamentada em soluções técnicas e econômicas viáveis.
Um paradigma que privilegie formas de energia ao custo do abandono de outras disponíveis no país, pode ser prejudicial até mesmo ao processo de transição.
5. Eficiência na Gestão Pública
A preocupação em garantir que o Brasil não se torne um campo de propaganda negativa durante a COP30, revela a necessidade de uma gestão pública eficiente e transparente.
Mecanismos que garantam a fiscalização dos recursos destinados a iniciativas ambientais, exigem resultados mensuráveis, com reais benefícios sociais e econômicos. O alinhamento da agenda ambiental à melhoria de vida da população e ao fortalecimento da economia, é essencial para conquistar o apoio popular das iniciativas.
Antes de mergulhar no "climatismo woke" ou no "populismo ambiental", é preciso resgatar os critérios do Zoneamento Ecológico-Econômico brasileiro, projetar, programar e implementar obras de infraestrutura logística, de abastecimento, de reservação de água - incluso na Amazônia, e atrair o setor eletro intensivo para perto de novas fontes de geração de energia - incluso a hidrelétrica. Pensar, enfim, para além do próximo mandato...
Faria melhor o governo brasileiro se buscasse implantar um bom sistema de gerenciamento de emergências - com previsão, prevenção, contingenciamento e operacionalidade face a eventos climáticos. Organizasse uma agência voltada a ações de adaptação e resiliência - envolvendo a defesa e manutenção das atividades econômicas e, sobretudo, parasse de cumprir penitências e comercializar indulgências climáticas - sem outro propósito que não o de alimentar militâncias e rezar cartilhas alarmistas de cunho meramente retórico.
Conclusão
A presente análise busca uma abordagem pragmática em relação às questões ambientais e energéticas. O equilíbrio entre desenvolvimento econômico e ações de proteção ambiental deve estar no centro da discussão sobre o clima.
Devemos promover um modelo que priorize a eficiência, a soberania e a inclusão do setor privado na agenda de transição energética.
A perspectiva jamais deve ser a de priorizar exigências internacionais sem o filtro crítico da realidade brasileira. A perspectiva deve ser a de garantir que as decisões tomadas em nível nacional, possam trazer benefícios concretos para o Brasil.
Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Exerceu o cargo pioneiro de Secretário Executivo de Mudanças Climáticas do Município de São Paulo, de junho de 2021 a julho de 2023. Sócio fundador do escritório Pinheiro Pedro Advogados, é diretor da AICA - Agência de Inteligência Corporativa e Ambiental. Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa - API. Foi o 1o. presidente da Comissão de Meio Ambiente da OAB/SP, presidente da Câmara Técnica de Legislação do CEBDS, presidente do Comitê de Meio Ambiente da AMCHAM, coordenador da equipe encarregada de elaborar o substitutivo do PL, no mandato do Relator - Dep. Mendes Thame, que resultou na Lei de Política Nacional de Mudanças Climáticas, consultor do governo brasileiro, do Banco Mundial, da ONU e vários outros organismos encarregados de aperfeiçoar o arcabouço legal e institucional do Estado no Brasil. Foi Secretário do Verde e do Meio Ambiente da Cidade de São Paulo (Gestão Régis de Oliveira - 2000). É Coordenador do Centro de Estudos Estratégicos do Think Tank Instituto Iniciativa DEX, Conselheiro do Conselho Superior de Estudos Nacionais e Política da FIESP, Presidente da Associação Universidade da Água - UNIÁGUA, Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.
Mais um texto excelente, Fernando! O parágrafo final "A perspectiva jamais deve ser a de priorizar exigências internacionais sem o filtro crítico da realidade brasileira. A perspectiva deve ser a de garantir que as decisões tomadas em nível nacional, possam trazer benefícios concretos para o Brasil", infelizmente não será ouvido, se ouvido não será entendido pçor este governo caolho e criminoso.
ResponderExcluirMerci beaucoup!
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ResponderExcluirO Brasil precisa de soluções que beneficiem o país e seu povo, não apenas atender a exigências internacionais.
Com esses Governantes que temos, Infelizmente levará muito tempo. Uma pena.
E mesmo complexo...
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