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sábado, 3 de dezembro de 2022

TRANSIÇÃO PARA O PASSADO

Precisamos de futuro. O passado dos que voltam não deixou saudades.


Por General Sérgio Etchegoyen


Chegamos ao término de mais um ano que parece ter percorrido a galope os seus 365 dias. Um ano difícil, no qual a duríssima disputa eleitoral fraturou famílias, abalou amizades, gerou profunda e preocupante desconfiança nas cortes superiores do país e cujo resultado aponta para um futuro de incertezas e inseguranças. Chegamos até aqui divididos e parece que seguiremos assim, infelizmente.

Jair Bolsonaro, escolhido por 49,10% dos eleitores para liderá-los na oposição, abdicou da tarefa e se recolheu a incompreensível silêncio.

O sumiço do governo que termina abriu espaço para que o que chega domine sozinho a cena política, lidere negociações e avance no Congresso com afagos aos supostamente eleitos para fazer oposição.

Até a Copa do Mundo, grande paixão dos brasileiros, deslocada no calendário, parece contaminada pelos maus humores políticos.

O pouco que se consegue ver em meio à densa e barulhenta polvadeira levantada pelas mais de quatro centenas de pessoas designadas para a equipe de transição, não aponta nenhuma novidade. Sobressaem rostos desgastados pelos escândalos de corrupção nas administrações passadas do Partido dos Trabalhadores e outros marcados pela incompetência, num ambiente em que o anacronismo ideológico parece ainda maior do que no passado. 

Não se pode esperar que comissões tão numerosas produzam algo aproveitável em 4 semanas. Impossível elaborar diagnósticos e recomendações confiáveis no exíguo prazo proposto e nesse ambiente de assembleia estudantil. O alvoroço sugere despudorada disputa por sinecuras.

Ao mesmo tempo, articula-se no Congresso a aprovação de emenda constitucional que autorize uma gastança que beira os 200 bilhões de reais! Um macabro “déjà vu” do apetite incontrolável por cargos e recursos públicos caracterizado em administrações anteriores. 

Não há o menor risco de dar certo, lamentavelmente. O explorado contribuinte seguirá bancando a festa.

O desconhecimento do “ethos” militar criou um falso impasse na chamada transição. As Forças Armadas são alicerçadas na hierarquia e na disciplina, como define a Constituição Federal. Instituições dessa natureza não admitem transição, nelas existe substituição. As rígidas normas éticas que sustentam aqueles fundamentos constitucionais não admitem a existência de dois comandantes em paralelo, tampouco dão liberdade para que os substitutos, mesmo quando já indicados, movam-se ou se manifestem fora de suas áreas de atribuições. 
Esperar que oficiais experimentados, com quase meio século de serviço, quebrem seus princípios e convicções, atropelando o processo castrense de passagem de comando é ignorância ou má fé.

A hostilidade já demonstrada ao mercado e a insegurança acenada para o empreendedor, atingem os que produzem riqueza e, por consequência, salários, impostos e ingressos sociais. Sem eles, nenhum governo, em nenhum lugar do mundo, terá o que distribuir. Argentina e Venezuela estão aí, como tristes exemplos da miséria para a qual a demagogia irresponsável e o populismo eleitoreiro podem arrastar os desassistidos que se alega beneficiar.

Precisamos de futuro. O passado dos que voltam não deixou saudades.



Sérgio Westphalen Etchegoyen é general de exército do Exército Brasileiro. Foi ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência do Brasil no Governo Michel Temer.


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