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domingo, 11 de dezembro de 2022

O ESTIGMA DE CONSTANTINOPLA

"O estigma de Constantinopla não está na sua queda, mas nos vícios e imperfeições que dão causa à derrocada de todos os impérios"


Por Maynard Marques de Santa Rosa


O poder se expande conforme a lei dos fluidos, segundo a teoria do poder. Desta forma, ao se gerar um vácuo de poder, alguém o ocupa, imediatamente. 

Foi o que ocorreu ao Império Bizantino, após a derrota na batalha de Manzikert, em 1071, quando os turcos passaram a avançar sobre o território da Anatólia. 

Bizâncio, tornada Constantinopla e sede do Império Romano do Oriente por Constantino, o Grande, em 330 d. C., durou 1.123 anos. Com o tempo, a força da cultura helênica fez substituir a língua latina pela grega e terminou convertendo o que era romano em bizantino, inclusive o comando político.  

A evolução, no entanto, não foi suficiente para superar as idiossincrasias da índole grega que causaram a guerra do Peloponeso, a submissão a Felipe da Macedônia e a servidão ao poderio de Roma.  

A sociedade de Constantinopla vivia em permanente ebulição. A ambição de poder das principais famílias, a tendência à ostentação, orgulho e vaidade desmedidos, traição, corrupção e crueldade dividiam o povo, contaminavam o Estado e enfraqueciam o Império. 

O golpe católico desferido pela IV Cruzada contra a cidade ortodoxa, em 1204, dividiu o Império Bizantino, com a criação do Império Latino. 

O Império Otomano gerou-se e prosperou em terras bizantinas. Em 1453, o sultão Mehmet II, vendo-se livre da ameaça mongol no flanco Oriental, partiu para o cerco de Constantinopla, com cerca de 80 mil combatentes e o apoio de canhões primitivos adquiridos na Itália. 

Os bizantinos acreditavam que suas muralhas eram inexpugnáveis. A defesa foi confiada ao “condottiere” genovês Giovanni Longo, que dispunha de 700 mercenários europeus e 8 mil soldados imperiais de Constantino XI Paleólogo.

O cerco turco durou 53 dias. Ferido, Longo evadiu-se em um navio genovês, fazendo desabar o moral dos defensores. Os canhões turcos abriram uma brecha na muralha, por onde penetraram os invasores e liquidaram a defesa. 

Constantino XI desapareceu durante a batalha e, com ele, toda a tradição do Império milenar. Constantinopla virou Istambul, de religião e cultura islâmicas. 

O estigma de Constantinopla não está na sua queda, mas nos vícios e imperfeições que dão causa à derrocada de todos os impérios, quando se propagam das pessoas para as instituições. 
  


General de Exército Maynard Marques de Santa Rosa é oficial reformado do Exército Brasileiro, formado pela Academia Militar das Agulhas Negras (Resende/RJ), tendo servido em 24 Unidades Militares do Território Nacional durante 49 anos de atividade na carreira. Possui mestrado pela Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais do Rio de Janeiro e doutorado em ciências militares pela Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, também do RJ. No exterior, graduou-se em Política e Estratégia, em pós-doutorado no U.S. Army War College (Carlisle/PA, 1988/89). Foi Ministro-chefe da secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE), no Governo Bolsonaro (2019).

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