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quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

O PAPEL DA CIÊNCIA

Estamos lotados de querelas e vazios de produção científica 





Por Maynard Marques de Santa Rosa


Enquanto muitos brasileiros bem informados dispersam tempo e energia em querelas irrelevantes, ficam as demandas relevantes relegadas ao arquivo morto da realidade. A agenda midiática imita a atitude dos primazes ortodoxos reunidos em concílio, no ano de 1453, durante o cerco de Constantinopla pelos turcos otomanos: o sexo dos anjos.      

É assim que a preocupação com o consumo governamental de leite condensado transcende a magnitude do “gap” tecnológico do país, que cresce a cada dia em relação ao estado da arte.  

O valor da importação de vacinas estrangeiras precede a verdadeira questão de mérito: por que não há uma vacina nacional contra o corona vírus?

Aqui, a pesquisa científica é um tabu confiado a poucos. À exceção dos institutos militares, a desarticulação das pesquisas, a inexistência de metas e a indefinição dos recursos comprometem a produtividade. A integração dos bancos de dados é, praticamente, inexistente; e a comunidade científica trabalha de modo desordenado, com dispersão de esforços e grande concentração de personalismo e interesse econômico.  

No Hemisfério Sul, o Brasil desponta como vanguarda da esperança na erradicação do flagelo das moléstias tropicais e na profilaxia das arboviroses. No entanto, o que exprime a nossa realidade é a ausência de uma política objetiva e o contingenciamento anual de R$ 2,198 bilhões do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT.  

Além disso, o nosso atraso não se resume à área funcional da Saúde. Há três anos, a comunidade científica brasileira foi surpreendida pelo lançamento de um nano-satélite argentino, com foguete próprio, e a sua colocação em órbita, enquanto aqui, uma pendência local de quilombolas impede, até hoje, a implantação da base de Alcântara.   

No campo nuclear, são notórios os avanços da Índia e de outros Estados periféricos em relação ao Brasil, mesmo detendo a ponta da tecnologia de enriquecimento de urânio, duramente conquistada por cientistas brasileiros nas décadas de 1970/80. Até o momento, não conseguimos industrializar o processo que poderia nos dar a autossuficiência. 

Enquanto isso, aprofundamos a dependência no campo digital e na robótica, e nos tornamos vulneráveis no domínio cibernético.

   A reflexão a que estamos condenados pelo confinamento poderia ser útil ao Brasil, se aproveitada como oportunidade para meditar, debater e talvez curar a cegueira nacional.         

 



  

General de Exército Maynard Marques de Santa Rosa é oficial reformado do Exército Brasileiro, formado pela Academia Militar das Agulhas Negras (Resende/RJ), tendo servido em 24 Unidades Militares do Território Nacional durante 49 anos de atividade na carreira. Possui mestrado pela Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais do Rio de Janeiro e doutorado em ciências militares pela Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, também do RJ. No exterior, graduou-se em Política e Estratégia, em pós-doutorado no U.S. Army War College (Carlisle/PA, 1988/89). Foi Ministro-chefe da secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE), no Governo Bolsonaro (2019).

  



Um comentário:

  1. Se não houve a implementação de Planejamento Estratégico partindo se de uma Visão de Estado/Nação em 2019, creio que quaisquer ensaios de Políticas Nacionais caiu num vazio incontestavel tremendo e em odisséia de Fogueira de Vaidades Institucionalizada.Com a tragédia de pandemia então veio a derrocada generalizada.Oxala no Médio termo 2025 possamos corrigir os rumos.

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