Em entrevista á Rádio Sputnik, Pinheiro Pedro fala sobre as pressões para a substituição do Ministro do Meio Ambiente, que medidas devem ser adotadas e qual o perfil do substituto.
Salles e Pinheiro Pedro em Brasília - Perda de interlocução pode motivar a saída do ministro |
DA REDAÇÃO
Nesta semana, o vice-presidente Hamilton Mourão se reuniu com investidores internacionais que ameaçaram retirar ou rever injeções financeiras no Brasil, caso o governo não se faça presente na crescente destruição da Amazônia. Outros nomes, como a ministra da Agricultura Tereza Cristina, também já tiveram de apagar incêndios não na floresta, mas sim em polêmicas de cunho ambiental.
A saída de Salles, do Ministério do Meio Ambiente, assim, parece iminente.
À Sputnik Brasil, o advogado Antônio Fernando Pinheiro Pedro, que integrou a equipe de transição do governo Bolsonaro, avaliou que tal cenário apenas expõe a perda de interlocução por parte de Salles. Considerando os conflitos hoje em andamento na área ambiental, isso precisa ser recuperado – o que talvez seja possível somente com uma mudança e a assunção no ministério de um quadro com perfil mais técnico.
Ouça a entrevista clicando aqui:
Leia a seguir, o teor da entrevista:
Após a exoneração do ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, da curta permanência no cargo de seu sucessor, Carlos Alberto Decotelli, e enfim sua substituição por Mílton Ribeiro, mais um ministro se vê pressionado a deixar o cargo, o titular do Meio Ambiente, Ricardo Salles. As pressões contra o ministro se intensificaram não só no exterior como especialmente no Brasil. Organizações Não Governamentais, ambientalistas, cientistas e diversas outras pessoas ganharam a adesão de poderosos empresários que consideram a presença de Ricardo Salles à frente do Ministério do Meio Ambiente como altamente prejudicial.
Sobre este assunto, vamos conversar agora com o advogado Antonio Fernando Pinheiro Pedro, fortemente atuante na área do Direito Ambiental e muito bem sintonizado com a política nacional.
Boa tarde, prezado Dr. Antonio Fernando Pinheiro Pedro. É sempre um enorme prazer contar com sua participação na Rádio Sputnik.
Boa tarde Arnaldo e queridos amigos da Rádio Sputnik.
Dr. Antonio Fernando Pinheiro Pedro, o Sr. entende que haja uma pressão organizada para a demissão do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles?
Há uma pressão organizada. Mas ela se deve à crescente desorganização ocorrente hoje na pasta do meio ambiente. portanto não é apenas uma ação organizada, mas sim uma reação à desorganização crescente que ocorre hoje na gestão ambiental federal no Brasil.
O que mantem Ricardo Salles no cargo e qual o preço político para o presidente Jair Bolsonaro ao manter Ricardo Salles à frente do Ministério do Meio Ambiente?
Ricardo Salles tornou-se um problema na medida em que perdeu a interlocução.
Ele perdeu a interlocução pelo governo com o público externo à administração, seja com os stakeholders da gestão ambiental, quais sejam - a sociedade civil organizada, grupos econômicos com atividades de impacto ambiental e as comunidades impactadas. E necessário que um gestor de meio ambiente mantenha interlocução permanente com esses setores, até mesmo para poder resolver os conflitos... e essa interlocução foi perdida. Ela começou muito difícil no ano passado, no início da gestão do governo Bolsonaro, mas ela foi se esgarçando e se esgarçou de vez no final do ano, quando começaram a ocorrer grandes eventos envolvendo impactos ambientais demandando a gestão do ministro, e essa gestão ficou muito aquém do que era necessário para resolver essas demandas. Então ele perdeu a interlocução. Não é mais um agente capaz de resolver conflitos em nome da gestão na esfera federal.
Mas o problema é pior. O ministro está perdendo a interlocução com o público interno, com os próprios administrados. Não há mais uma comunicação efetiva entre o que faz o gabinete do ministério e o que está acontecendo no restante da administração federal na tutela do meio ambiente. tanto que o próprio vice presidente foi acionado para presidir uma GLO na região amazônica, justamente porque a gestão ambiental brasileira, sozinha, não tinha mais condições de realizar uma fiscalização eficaz.
Com isso acontece que o governo fica demandado a substituir o seu gestor. e não fez até agora porque não tem quadro para atender à demanda de interlocução mas principalmente tenha afinidade com o que pensa o gabinete da presidência.
O presidente Jair Bolsonaro, o vice-presidente Hamilton Mourão, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, o ministro da Economia, Paulo Guedes, entre outros membros do governo, têm reiterado, especialmente no âmbito externo, que, ao contrário das críticas que tem recebido, o governo segue uma política respeitosa para com o Meio Ambiente. Recentemente, o ministro da Economia, Paulo Guedes, admitiu a existência de “erros” e assegurou a uma plateia internacional que “os erros serão corrigidos.” Isto é suficiente para aplacar as pressões contra Ricardo Salles?
A interlocução do governo federal como um todo em relação ao público externo é dificultosa, porque há uma "Síndrome de Janus"* no governo federal. Uma coisa é a máquina do governo federal que trabalha efetivamente, principalmente nas ações estruturantes, como é o caso dos ministérios da agricultura, com Tereza Cristina, de Infraestrutura, com Tarcísio e Economia, com Paulo Guedes, que entrega o que se propõe a fazer. Mas há um segundo rosto, ideológico, politizado, que interfere diretamente na gestão ambiental, que se tornou menos técnica e mais política, atraindo todo tipo de conflito. Com isso acabou transferindo a carga de demandas para os outros ministérios, mais técnicos, como agricultura, infraestrutura e economia. Essa sobrecarga termina acarretando perda de credibilidade na esfera federal, com sobrecarga para os ministros e vice-presidente da república.
As substituições no ministério de Jair Bolsonaro têm sido marcadas por muita polêmica e muita discussão. Caso se efetive a saída de Ricardo Salles, qual deverá ser o perfil do seu substituto?
Há necessidade de se fazer um roteiro estratégico para a substituição do ministro.
Primeiro é necessário resgatar a gestão ambiental retorne para o conjunto de organismos administrativos técnicos, como agricultura, infraestrutura e economia. É preciso que o próximo escolhido tenha um perfil mais técnico, conhecimento jurídico ou científico necessário para poder reorganizar o sistema nacional do meio ambiente e resgatar a interlocução técnica do governo com o seu público interno e externo.
A primeira coisa é montar um conselho de ministros com o presidente da República, incluído o ministro do Meio Ambiente. É necessário que o Sisnama deixe de ser uma mula sem cabeça, e que se instale um Conselho Superior de meio ambiente no governo, como manda a Lei, vinculado ao Presidente da República, composto pelos ministros mais afetos à área, para decidir a política ambiental federal.
Segundo, é necessário a reconstituição do sistema de gestão ambiental, seja no que tange ao Sisnama, a partir do Conselho Nacional do Meio Ambiente, seja no que tange as outras ações importantes como a questão da mudança climática e da biodiversidade. Que o novo ministro se ocupe em reconstituir o sistema ambiental. Repor os organismos de interlocução. É preciso resgatar esses órgãos e resgatar a interlocução.
Terceiro, é preciso montar uma sala de situação, para que se atue em equipe - é sabido que o ministro Ricardo Salles não sabe trabalhar em equipe e necessário na gestão ambiental que se saiba trabalhar em equipe. Por isso a necessidade de uma sala de situação, para lidar com as questões emergenciais e acompanhar diuturnamente a implementação dos programas e políticas públicas do setor.
Esse deve ser o perfil do substituto.
Dr. Antonio Fernando Pinheiro Pedro, muito obrigado por mais esta entrevista para a Rádio Sputnik Brasil.
Conversamos com o advogado Antonio Fernando Pinheiro Pedro, especialista em Direito Ambiental, sobre as pressões para que Ricardo Salles seja exonerado do Ministério do Meio Ambiente.
Nota
* Janus é um deus romano com uma cabeça com dois rostos, voltados para direções opostas, uma cabeça com duas faces: a que olha para o passado, a que vislumbra o futuro, a que observa os erros, a que enxerga os acertos, a que vislumbra o certo, a que mira o errado.
https://soundcloud.com/sputnikbrasil/entrevista-com-antonio-fernando-pinheiro-pedro-5
#gestaoambiental #crisenomeioambiente #sisnama #amazonia
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