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quinta-feira, 16 de julho de 2020

A CRISE NO MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE E O QUE DEVE SER FEITO

Em entrevista á Rádio Sputnik, Pinheiro Pedro fala sobre as pressões para a substituição do Ministro do Meio Ambiente, que medidas devem ser adotadas e qual o perfil do substituto. 


 Salles e Pinheiro Pedro em Brasília - Perda de interlocução pode motivar a saída do ministro


DA REDAÇÃO


Nesta semana, o vice-presidente Hamilton Mourão se reuniu com investidores internacionais que ameaçaram retirar ou rever injeções financeiras no Brasil, caso o governo não se faça presente na crescente destruição da Amazônia. Outros nomes, como a ministra da Agricultura Tereza Cristina, também já tiveram de apagar incêndios não na floresta, mas sim em polêmicas de cunho ambiental.

A saída de Salles, do Ministério do Meio Ambiente, assim, parece iminente. 

À Sputnik Brasil,  o advogado Antônio Fernando Pinheiro Pedro, que integrou a equipe de transição do governo Bolsonaro,  avaliou que tal cenário apenas expõe a perda de interlocução por parte de Salles.  Considerando os conflitos hoje em andamento na área ambiental, isso precisa ser recuperado – o que talvez seja possível somente com uma mudança e a assunção no ministério de um quadro com perfil mais técnico. 

Ouça a entrevista clicando aqui: 




Leia a seguir, o teor da entrevista: 

Após a exoneração do ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, da curta permanência no cargo de seu sucessor, Carlos Alberto Decotelli, e enfim sua substituição por Mílton Ribeiro, mais um ministro se vê pressionado a deixar o cargo, o titular do Meio Ambiente, Ricardo Salles. As pressões contra o ministro se intensificaram não só no exterior como especialmente no Brasil. Organizações Não Governamentais, ambientalistas, cientistas e diversas outras pessoas ganharam a adesão de poderosos empresários que consideram a presença de Ricardo Salles à frente do Ministério do Meio Ambiente como altamente prejudicial.

Sobre este assunto, vamos conversar agora com o advogado Antonio Fernando Pinheiro Pedro, fortemente atuante na área do Direito Ambiental e muito bem sintonizado com a política nacional.

Boa tarde, prezado Dr. Antonio Fernando Pinheiro Pedro. É sempre um enorme prazer contar com sua participação na Rádio Sputnik.

Boa tarde Arnaldo e queridos amigos da Rádio Sputnik. 

Dr. Antonio Fernando Pinheiro Pedro, o Sr. entende que haja uma pressão organizada para a demissão do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles? 

Há uma pressão organizada. Mas ela se deve à crescente desorganização ocorrente hoje na pasta do meio ambiente. portanto não é apenas uma ação  organizada, mas sim uma reação à desorganização crescente que ocorre hoje na gestão ambiental federal no Brasil.

O que mantem Ricardo Salles no cargo e qual o preço político para o presidente Jair Bolsonaro ao manter Ricardo Salles à frente do Ministério do Meio Ambiente?

Ricardo Salles tornou-se um problema na medida em que perdeu a interlocução. 

Ele perdeu a interlocução pelo governo com o público externo à administração, seja com os stakeholders da gestão ambiental, quais sejam - a sociedade civil organizada, grupos econômicos com atividades de impacto ambiental e as comunidades impactadas. E necessário que um gestor de meio ambiente mantenha interlocução permanente com esses setores,  até mesmo para poder resolver os conflitos... e essa interlocução foi perdida.  Ela começou muito difícil no ano passado, no início da gestão do governo Bolsonaro, mas ela foi se esgarçando e se esgarçou de vez no final do ano, quando começaram a ocorrer grandes eventos envolvendo impactos ambientais  demandando a gestão do ministro, e essa gestão ficou muito aquém do que era necessário para resolver essas demandas.  Então ele perdeu a interlocução. Não é mais um agente capaz de resolver conflitos em nome da gestão na esfera federal.  

Mas o problema é pior. O ministro está perdendo a interlocução com o público interno, com os próprios administrados. Não há mais uma comunicação efetiva entre o que faz o gabinete do ministério e o que está acontecendo no restante da administração federal na tutela do meio ambiente.  tanto que o próprio vice presidente foi acionado para presidir uma GLO na região amazônica, justamente  porque  a gestão ambiental brasileira, sozinha, não tinha mais condições de realizar uma fiscalização eficaz.  

Com isso acontece que o governo fica demandado a substituir o seu gestor. e não fez até agora porque não tem quadro para atender à demanda de interlocução mas principalmente  tenha afinidade com o que  pensa o gabinete da presidência.

O presidente Jair Bolsonaro, o vice-presidente Hamilton Mourão, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, o ministro da Economia, Paulo Guedes, entre outros membros do governo, têm reiterado, especialmente no âmbito externo, que, ao contrário das críticas que tem recebido, o governo segue uma política respeitosa para com o Meio Ambiente. Recentemente, o ministro da Economia, Paulo Guedes, admitiu a existência de “erros” e assegurou a uma plateia internacional que “os erros serão corrigidos.” Isto é suficiente para aplacar as pressões contra Ricardo Salles?

A interlocução do governo  federal como um todo em relação ao público externo é dificultosa, porque há uma "Síndrome de Janus"* no governo federal. Uma coisa é a máquina do governo federal que trabalha efetivamente,  principalmente nas ações estruturantes, como é o caso dos ministérios da agricultura, com Tereza Cristina, de Infraestrutura, com Tarcísio e Economia, com Paulo Guedes,   que entrega o que se propõe a fazer. Mas há um segundo rosto, ideológico,  politizado, que interfere diretamente na gestão ambiental, que  se tornou menos técnica e mais política, atraindo todo tipo de conflito. Com isso acabou transferindo a carga de demandas para os outros ministérios, mais técnicos, como agricultura, infraestrutura e economia.  Essa sobrecarga termina acarretando perda de credibilidade na esfera federal, com sobrecarga para os ministros e vice-presidente da república.  

As substituições no ministério de Jair Bolsonaro têm sido marcadas por muita polêmica e muita discussão. Caso se efetive a saída de Ricardo Salles, qual deverá ser o perfil do seu substituto?

Há necessidade de se fazer um roteiro estratégico para  a substituição do ministro. 

Primeiro é necessário resgatar a gestão ambiental retorne para o conjunto de organismos administrativos técnicos, como agricultura, infraestrutura e economia. É preciso que o próximo escolhido tenha um perfil mais técnico, conhecimento jurídico ou científico necessário   para poder reorganizar o sistema nacional do meio ambiente e resgatar a interlocução técnica do governo com o seu público interno e externo. 

A primeira coisa é montar um conselho de ministros com o presidente da República, incluído o ministro do Meio Ambiente.  É necessário que o Sisnama deixe de ser uma mula sem cabeça, e que se instale um Conselho Superior de meio ambiente no governo, como manda a Lei,  vinculado ao Presidente da República,  composto pelos ministros mais afetos à área, para decidir a política ambiental federal. 

Segundo, é necessário a reconstituição do sistema de gestão ambiental, seja no que tange ao Sisnama, a partir do Conselho Nacional do Meio Ambiente, seja no que tange as outras ações importantes como a questão da mudança climática e da biodiversidade. Que o novo ministro se ocupe em reconstituir o sistema ambiental. Repor os organismos de interlocução. É preciso resgatar esses órgãos e resgatar a interlocução. 

Terceiro, é preciso montar uma sala de situação, para que se atue em equipe - é sabido que o ministro Ricardo Salles não sabe trabalhar em equipe e necessário na gestão ambiental que se saiba trabalhar em equipe. Por isso  a necessidade de uma sala de situação,  para lidar com as questões emergenciais e acompanhar diuturnamente a implementação dos programas e políticas públicas do setor. 

Esse deve ser o perfil do substituto. 

Dr. Antonio Fernando Pinheiro Pedro, muito obrigado por mais esta entrevista para a Rádio Sputnik Brasil.

Conversamos com o advogado Antonio Fernando Pinheiro Pedro, especialista em Direito Ambiental, sobre as pressões para que Ricardo Salles seja exonerado do Ministério do Meio Ambiente.



Nota
* Janus é um deus romano com uma cabeça com dois rostos, voltados para direções opostas, uma cabeça com duas faces: a que olha para o passado, a que vislumbra o futuro, a que observa os erros, a que enxerga os acertos, a que vislumbra o certo, a que mira o errado.


Link para a entrevista:  

https://soundcloud.com/sputnikbrasil/entrevista-com-antonio-fernando-pinheiro-pedro-5


#gestaoambiental #crisenomeioambiente #sisnama #amazonia 

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