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sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

TRAGÉDIA EM BRUMADINHO - O QUE FAZER

Hora de vencer a sensação de impotência e arregaçar as mangas!





Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro



Tristeza e impotência

Sensação de impotência ante uma tragédia anunciada é a pior de todos os sentimentos que podem acometer um profissional experiente como eu. É isso que sinto neste momento, quando vejo pela TV e leio pelas redes sociais as informações que chegam a respeito da tragédia do rompimento das barragens de rejeito de minérios, operadas pela Cia. Vale, em Brumadinho - MG. 

Primeiro, verifico que apesar do alto nível de qualidade profissional dos responsáveis pela gestão ambiental, gestão das operações e gestão de risco da mineradora, o desastre ocorreu sem que sequer um alerta sonoro fosse emitido... sem que houvessem sensores instalados para  detectar os sinais clássicos de rompimento da barragem, sem que a rotina de contingência fosse notada e a de emergência parecesse existir.

A barragem que rompeu estava acima da que foi inundada pela avalanche. Assim, a tragédia poderia, em tese, ter sido muito pior. Nessas circunstâncias, os cuidados deveriam ser constantes e redobrados, em especial pelo fato da estrutura estar em fase de descomissionamento. Nada pode ser descartado, incluso sabotagem (e isso não exime a empresa de responsabilidades com a segurança local). 

O mais impressionante é ter a mineradora instalado escritórios e refeitório à jusante das barragens - um misto de arrogância com temeridade... 

Há responsabilidades a serem apuradas, sem dúvida, e procedimentos a serem auditados. Mas, no momento, o foco é atender à emergência. 

A transparência nas comunicações começa a surgir timidamente, mas percebe-se que  não ocorreu mídia training digna desse nome e gerenciamento resolutivo de crise, incluso o jurídico.   

No Brasil, as tragédias se repetem, ás vezes com os mesmos personagens, porque ninguém realmente parece cobrar eficácia, embora ostente eficiência (coisas bem diferentes). 

No fundo, há uma coreografia de faz de conta. A chamada síndrome do time-sheet... protagonizada pelas grandes padarias de prestação de serviço, de consultoria, engenharia e assessoria jurídica, onde uns fornecem o de sempre, outros consomem a mesmice, e todos fingem que atingiram os respectivos objetivos. Esbanja-se dinheiro em coquetéis, seminários com autoridades, mídia contratada e propaganda.  Quando a barragem rompe, e pessoas morrem... e o cronômetro volta á estaca zero (inclusive o time-sheet).

Mas o foco, agora, é atender á emergência!

O governo de Minas Gerais, dá todas as mostras de ter mesmo começado ontem. O problema é que o Poder Público do Estado de Minas é anterior, e transcende a equipe de governo. Ao que tudo indica, o novo governo, literalmente, desmontou sua organização de atendimento a emergências, desmobilizou equipes e... foi literalmente pego de calças curtas pelo desastre. A recomposição pode ocorrer rapidamente - pois as unidades militares de defesa civil são permanentes - mas o susto... custa vidas.

Com o governo federal não foi diferente. Embora louvável a intenção do Presidente da República de ir a Minas Gerais ver de perto o desastre - a divulgação temerária dos detalhes da visitação transpira que o deslocamento será similar a uma "excursão turística" até a tragédia.  A somatória de ministros em um mesmo evento, aliás, mostra claramente que o gabinete de crise está batendo cabeça e os chefes de cada setor não se encontram ocupados em tarefas específicas. 

Mas vamos manter o foco na emergência da tragédia.


O que deve ser feito

Por óbvio que o setor de minas e energia já deve estar em campo recolhendo todas as informações sobre a extração efetuada no local, sobre o uso das barragens de rejeitos, conferindo as licenças e o plano de lavra, número de pessoas empregadas e a composição dos resíduos.  

O setor de defesa civil  federal deve estar analisando como retardar, derivar e obstruir o fluxo da lama, evitando a ampliação dos danos. Em especial a contaminação dos recursos hídricos destinados ao abastecimento humano.  Já o ministério do meio ambiente e IBAMA devem estar articulando as ações de prevenção ao aumento dos danos, conferindo as licenças e autorizações e preparando as autuações, subsidiariamente ao estado e em conjunto com a Polícia Federal - responsável pela investigação das causas no campo criminal.

Ao presidente, cumpre ouvir o governador, o prefeito, e seus principais assessores em um gabinete de emergência no local, organizando a articulação dos entes federados para o atendimento á tragédia e apuração das responsabilidades. 

O governo do Estado tem obrigação de realizar as buscas e salvamentos, atender á população enviar a fiscalização ambiental, providenciar abrigos, organizar o atendimento hospitalar e assistência social. 

O relógio deve ser dividido em horas, com prazos para cumprimento de metas estabelecidos, para atendimento das demandas emergenciais e enfrentamento dos efeitos advindos da tragédia. 

Parece óbvio, mas não é. E essas ações devem ser comunicadas, mas não pelas autoridades que deverão estar empenhadas full time na atividade. Por isso, uma eficiente estrutura de comunicação se faz necessária. 

A busca pelos desaparecidos, o restabelecimento das comunicações locais, a conjugação de esforços, incluso com a empresa responsável pelas barragens, visando mitigar os danos e atender às emergências, devem constituir o foco principal da atividade integrada dos poderes da república.

Depois... investigar a fundo os fatos e identificar os  responsáveis. 

Lei e meios de implementação para isso, não faltam. O que se deve buscar agora, é gente competente para fazê-lo. 

Mãos a obra!


Para aprofundar o cenário, vale a pena ler: 

"TV CULTURA DEBATE DESASTRE AMBIENTAL DE MARIANA  - O Impacto Ambiental do rompimento da barragem da mineradora Samarco em Mariana - MG, debatido em todos os seus aspectos", in  https://www.theeagleview.com.br/2015/12/tv-cultura-debate-desastre-ambiental-de.html

"CRIME AMBIENTAL - RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA - Natureza econômica do delito e sua investigação", in https://www.theeagleview.com.br/2013/06/crimes-ambientais-afericao-da.html





Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB.  É  Editor- Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.




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