Ameaças de ruptura institucional sempre se esgotaram na impassibilidade fria das Forças Armadas
Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro
A américa latina é vítima preferencial do populismo.
Fruto de multi-colonizações e destino de correntes migratórias seculares, a América Latina permanece em constante desintegração social, sofre com profundas disparidades econômicas e cultiva estruturas de poder parasitárias.
Há um desprezo absoluto com o ensino básico, com a formação moral e o civismo, em toda a América Latina. Com isso, bons quadros se perdem, cientistas emigram e medíocres predominam. Isso forma o caldo de cultura do populismo.
Desde o século XIX, a América Latina sofre com trágicas parábolas populistas. Na verdade, o populismo é a chaga que impede o desenvolvimento político e econômico do continente latino-americano.
O contexto no Brasil
O populismo está no centro da crise no Brasil.
O conflito institucional, proveniente da reação popular face à péssima condução do processo eleitoral por um judiciário "engajado" num processo de "retomada" globalista do poder central, desembocou na onda de insatisfação e na pantomima do cenário lamentável de depredação ocorrido em Brasília, no início da nova gestão de Lula.
A ocorrência misturou o extravazamento público de uma multidão inconformada com um resultado eleitoral sistematicamente questionado, abandonada à própria sorte pela liderança que a estimulava, com um gatilho preparado por radicais interessados em desmobilizar o movimento, criminalizando-o.
A estratégia do "Flautista de Hamelin", aplicada na ocorrência, é conhecida da inteligência de estado. Faz parte da história da tragédia populista em todo o mundo... e não é novidade no Brasil.
O "golpe", em verdade, estava no "contragolpe" encetado pelo establishment e "contratado" a uma magistratura encarregada de implementá-lo de forma "terceirizada", desviando o foco do executivo e dando ares "institucionais" à ação - tal como na Venezuela.
O fato foi imediatamente apropriado pelo governo petista e sua rede de comunicação engajada, como mote para legitimar o processo de repressão arbitrária, visando tirar proveito do caos.
A verdade, porém, sempre reina absoluta. Aos poucos os fatos desnudam a arapuca e revelam o verdadeiro golpismo contra o pluralismo democrático. A história é sempre implacável.
Os sistemas de inteligência e os militares brasileiros, embora hoje sob pressão, mantém-se atentos e vacinados. Essa a razão dos esforços do establishment se concentrarem hoje na destruição do sistema de inteligência de Estado, na transformação da polícia federal em uma espécie de "gestapo" a serviço do centro de persecução e repressão instalado no STF e... no esgarçamento completo da jurisdição militar, expondo oficiais e praças à sanha persecutória da autoridade "civil"... sob as vistas de um comando claudicante, omisso e subalterno das Forças Armadas.
Tudo isso... porque o antídoto à manipulação populista, no Brasil, sempre esteve nas forças de defesa.
Na história recente, as forças de defesa agiram ceticamente no primeiro período do governo lulopetista, reagiram negativamente com Dilma, mantiveram-se vigilantes no governo Temer, permaneceram vigilantes no governo Bolsonaro e, agora, não por outra razão, sofrem rápido "desmantelamento" no início do governo Lula.
A reação intestina em progresso, nas hostes militares, no entanto, revela que o sapo barbudo não será facilmente digerido...
O remédio está no próprio sistema democrático, que legitima as instituições que garantem a soberania popular e, por isso mesmo, sofre metódico ataque dos populistas, à esquerda e à direita.
Polarização e crise
O novo governo investiu pesado contra a organicidade de instituições de segurança que deviam gozar de autonomia. Em um mês de gestão, Lula substituiu 18 diretores regionais da Polícia Federal, exonerou 26 chefes regionais da Polícia Rodoviária Federal, demitiu 80 militares de cargos diversos no segundo escalão e... substituiu o Comandante do Exército.
Formou-se uma onda de expurgos e prisões atrabiliárias, sem culpa formada, sem individualização de condutas e com elementos indiciários toscos. Monstruosidades jurídicas produzidos por uma máquina inquisitorial instalada no STF, retrato da tragédia anunciada, advinda da polarização populista.
Em verdade, a jusburocracia moldada por décadas de esquerdismo e alimentada também por um bolsonarismo sem foco, acomoda hoje a pior extração da história do Brasil. Tornou-se um escritório jurídico a serviço de teses de ocasião, moldadas ao sabor do que o esquerdismo excreta.
O pêndulo é sinistro. Um populismo de direita, absolutamente reativo e igualmente periculoso, renasceu em discursos pretensamente militaristas, buscando colar seu rótulo na liderança de Bolsonaro. Agora, testemunhamos a República ser entregue, de bandeja, para o consórcio de narcoestados conduzido pelo Foro de São Paulo.
Claro que há uma sucessão de erros que precedem o estado de coisas atual. O discurso de Bolsonaro foi ambíguo, flertou inicialmente com a raiz anti-populista do aparato militar para, em momentos críticos, deixar-se levar por um populismo rastaquera - assustando comandantes militares na ativa.
Como ex-paraquedista, o líder político da direita brasileira buscou no início um terreno equidistante para descer no planalto em segurança. O risco do fascismo permaneceu, porém, intrínseco em vários meios bolsonaristas, diluídos numa inconoclastia liberticida. Aliás, foi essa indefinição a causa da rejeição difusa que "justificou" as manobras de "descondenação" e reabilitação de Lula, sob as fuças do aparato bolsonarista; permitiu a aproximação eleitoral - a "condução" judicializada das eleições e a volta do lulopetismo, com firme apoio da jusburocracia populista de esquerda - mantida intacta por absoluta falta de foco do governo do Capitão.
Assim, se nos "livramos" de um populismo de sinais trocados - provindo da direita, caímos (de novo), na frigideira de posturas criminosas do populismo esquerdista.
A onda de repressão, a pretexto de combater o "golpismo", coordenada pela cúpula da pior extração da história do judiciário brasileiro, não irá, contudo, afastar a enorme rejeição popular aos protagonistas do maior caso de corrupção já registrado na história da humanidade.
A memória do período em que o país mergulhou no mais deslavado populismo pretensamente "Chavista", remanesce na mente dos mais velhos, sobre uma massa de jovens ensimesmados. Isso se reflete na média etária dos detidos por "atos antidemocráticos".
A crise demonstra que não basta seguir um calendário eleitoral cada vez mais judicializado, para livrar o Estado brasileiro da doença do populismo. Pelo contrário, o que vemos é uma narcoditadura instalar-se rapidamente na República.
Porém, buscar dobrar a espinha das Forças Armadas, só irá agravar o quadro.
O populismo judiciário
A jusburocracia brasileira, foi cuidadosamente infiltrada e cooptada nas décadas passadas pelo "bolivarianismo" petista.
O populismo judicante está incrustado nos tribunais superiores, na justiça federal e ministério público. Ali, seguimentos esquerdistas permanecem empenhados em judicializar a Administração Pública, relativizar mandatos, desfazer a soberania popular, censurar a liberdade de opinião, reduzir a autonomia do legislativo, desmobilizar a economia e desacreditar investimentos.
A degradação administrativa que hoje ocorre, se dá por meio do esmagamento judiciário a mandatários públicos e atividades privadas. A insegurança jurídica desembarca na judicialização da política.
O fenômeno é agravado pelo fato do estamento judiciário manter-se indene do controle social e blindado por mecanismos corporativistas - uma profunda distorção ocorrida no regime constitucional introduzido em 1988.
Para a corrente dos bolivarianos de toga, nossa Constituição fundou um Estado onde o Direito está democraticamente conformado em um sistema que deve buscar "menos a legalidade e mais a legitimidade".
Nossa jusburocracia não resolve conflitos, ela os cria.
Se a complexidade dos poderes da república permitiu ações incrivelmente meritórias, como as operações de combate à corrupção, de saneamento eleitoral, etc, é visível hoje a reação corporativista ao próprio saneamento - e essa resistência tem apoio dissimulado nos meios de comunicação, academias, parlamentos, etc. - um aparato narcopopulista que forma a sustentação do governo atual.
O aparato narcopopulista, hoje, está engajado no processo de sufocamento do regime democrático... sob o pretexto de "salvá-lo". Só não conclui "o serviço" por não ter o comando da descarga na latrina da história - ainda sob a guarda das Forças Armadas.
Embora busque cooptar e submeter o atual comando das forças armadas, o aparato ditatorial jusburocrático ainda não atingiu corações e mentes do corpo militar.
O foco de resistência às pretensões hegemônicas populistas sempre se concentrou nas forças de segurança militares, principalmente nas Forças Armadas. E as Forças Armadas do Brasil sempre foram avessas ao populismo... e continuam sendo.
O antídoto militar brasileiro
Se a degradada jusburocracia deixou-se contaminar pelo populismo, o mesmo não ocorreu até o momento com o cerne das Forças Armadas do Brasil.
Militares brasileiros, historicamente, não toleram o populismo. Sempre foram seu antídoto.
A doutrina militar brasileira foi toda construída na base conservadora da Armada Imperial, na afirmação Republicana do Exército (baseado na rejeição de Caxias aos desmandos do Império na fase final da Guerra do Paraguai), na modernidade tecnológica da Força Aérea e, sobretudo, na experiência antifascista e anticomunista adquirida na 2a. Guerra e na Guerra Fria.
Quando chamados a intervir no cenário político nacional, em 1964, os militares o fizeram justamente para por fim à política populista praticada no governo João Goulart. Assumiram o poder mediante aprovação do próprio Congresso Nacional - que aprovou a nomeação de Castelo Branco. A sucessão posterior de "atos institucionais" seguidos de forte repressão - esta sim, os associa ao "regime de exceção" terminado em 1985 - porém, sempre em reatividade ao risco populista remanescente.
A postura anti-populista foi o fator que desengajou os líderes militares da busca pela perpetuação no Poder. Permitiu ao país, com todas as exceções, adotar um projeto de desenvolvimento tecnocrático e impessoal, em bases planejadas. O distanciamento do populismo permitiu que se controlasse, ainda que precariamente, a corrupção endêmica.
Após o período militar, nos momentos em que governos civis se aventuraram a usar uma plataforma filo populista, ocorreu o desastre: Sarney e seu "plano cruzado", Collor e seu "Plano Collor", Lula com a internacionalização das obras públicas em favor do "Socialismo do Século XXI", Dilma com sua medíocre política de "desonerações tributárias" e Bolsonaro com sua mal explicada cruzada contra a "vachina" na pandemia de Covid.
O desastre das iniciativas populistas à esquerda produziu desemprego, miserabilidade e concentração econômica. Já à direita, a polarização bolsonarista poluiu redes sociais, provocou ondas de teorias da conspiração, ameaças de golpe com o "eu autorizo" e desacreditou autoridades e instituições - sem qualquer proposição de reforma efetiva (um erro imperdoável, face à grande oportunidade conferida pela história).
Nesse período, e até o fim melancólico da gestão de Bolsonaro - que abandonou o País dias antes da transmitir a presidência, os militares permaneceram impassíveis, obedientes aos princípios de disciplina, hierarquia, e cientes que até mesmo o acionamento do dispositivo constitucional de garantia (art. 142 da CF) estava adstrito à decisão intransferível do Presidente da República no exercício do comando.
Se Bolsonaro não o fez... e voou pra fora do País, que não se culpe o estamento militar pela impassibilidade daquele momento.
As ameaças de ruptura institucional, no entanto, como se vê, sempre se esgotaram na impassibilidade fria das Forças Armadas.
A formação militar, calcada em valores absolutos e princípios morais inquestionáveis, contrasta com a relativização hipócrita imposta pelo populismo à massa social.
Assim, não será surpresa se, na volta do pêndulo da história, houver eventual necessidade de buscar alguma estabilidade institucional nos quadros militares - imunes ao populismo - talvez pela própria via democrática.
Esse alerta deve se fixar na mente de nossos dirigentes, para além das bravatas e dos deslumbres efêmeros com o próprio protagonismo.
Conclusão
A postura crítica é essencial para o combate ao vírus da liderança populista, à direita e à esquerda.
Não há "salvadores da pátria" e nenhum país civilizado precisa de um.
A "Vitória de Pirro" da esquerda brasileira, sob uma chuva de contestações, não autoriza o clima revanchista, muito menos movimentos de expurgo nas Forças de Segurança e perseguição judicial generalizada.
A crise observada no início do governo só evidencia o risco populista. O fato demanda profunda reforma institucional, para que não mais se repitam parábolas trágicas.
Razão para que o dispositivo militar brasileiro redobre a atenção e o aparelho de estado recupere capacidade para se reestruturar, eliminando o vírus populista inoculado em seu estamento burocrático.
O clima revanchista e o acirramento de ânimos expressam falta de autoridade moral dos arroubos populistas que assolam as instituições da República. A realidade das coisas, como dito, é absoluta, e irá cobrar do Estado respeito às garantias individuais, ao pluralismo, à legalidade e à moralidade.
Nos resta o equilíbrio nas Forças Armadas e esperança renovada na legislatura nacional, sempre renovada... apesar das lamentáveis cooptações e traições.
Hora, portanto, de redobrar a inteligência e atentar para o que se move abaixo da superfície envernizada pela mídia comprada... e nos subterrâneos do processo político em nosso país.
Não há mais espaço para a hesitação. A democracia e a liberdade exigem eterna vigilância - já diziam Churchill e Carlos Lacerda.
A eterna vigilância compete ao Povo, ao Parlamento (sempre conspurcado mas presente nas crises), à inteligência de Estado (que não se confunde com a de governo) e à alma inabalável das Forças Armadas - qud difere claramente líderes e subalternos.
A história é implacável e os acontecimentos sempre marcham.
*Antonio Fernando Pinheiro Pedro – Advogado formado pela USP, consultor ambiental, exerce atualmente o cargo de Secretário Executivo de Mudanças Climáticas da Cidade de São Paulo. Foi sócio fundador do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e da Comissão Nacional de Direito Ambiental do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB. É Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa – API, Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal, do Mural Eletrônico Dazibao e responsável pelo blog The Eagle View
Parabéns Sec. Pedro Pinheiro Pedro. Importante e esclarecedor artigo, oxalá seja bem divulgado.
ResponderExcluirFernando Pinheiro Pedro. Parabéns pela visão bem posta sobre o quadro político em que se encontra o país. A beira do domínio populista de esquerda o Brasil precisa ficar vigilante. Abraço
ResponderExcluirSinto muito Fernando Pinheiro. O Governo Bolsonaro teve, sim, vontade política de decretar o ART. 142 da CF. O povo brasileiro teve vontade de ativar um mecanismo constitucional de defesa contra o golpe enrustido e eleitoral que aconteceu, planejado e executado pela esquerda. Só não viu quem é cego, surdo e alienado.
ResponderExcluirForam os oficiais-generais, envenenados pelo poder , ganhos políticos e financeiros que fugiram de suas responsabilidades republicanas e democráticas.
Não existem no Brasil FFAA como antes, no período do Governo Militar. Todos foram enfraquecidos e dominados pelas forças de embuste dos esquerdopatas.
Sou militar de alta patente e sei muito bem como funciona o sistema venal dentro do militarismo.
Perfeito!!!
ExcluirO MEU MUITO OBRIGADA POR ME MOTIVAR LER SEUS TEXTOS APESAR DO MEUS DÉFICITS VISUAIS... OS SEUS TEXTOS ME FAZEM VOLTAR AO MEU HISTÓRICO A PARTIR DOS ANOS 60......E DE LÁ PRA CÁ VI E VIVI MUITAS HISTÓRIAS DESSA POLÍTICA BRASILEIRA...
ResponderExcluirSOU UMA CIDADÃ DO MUNDO QUE QUERO VIVER COM MEUS DIREITOS RESPEITADOS...
UM ABRAÇO GRANDE E FRATERNO E FRATERNO.
🇧🇷Preciso! e Conciso! Parabéns!!!!🇧🇷
ResponderExcluirEssa curiosa impassibilidade fria (aparentemente conivente) dos militares diante das sucessivas violações escandalosas da Constituição exclusivamente perpetrada pela esquerda e seus braços do judiciário, e da mídia a serviço, com perseguições políticas, inquéritos ilegais, censura explícita e velada a conservadores, prisões e exílio de inocentes, tratamento privilegiado escancarado do judiciário e desencarceramento de bandidos políticos e agentes governamentais altamente corruptos e narcotraficantes, manipulação explícita dos processos eleitorais, usurpação de poderes pelo stf, cassações injustas absurdas e ilegais, reuniões com ditadores sanguinários e narcotraficantes internacionalmente procurados pela polícia" etc etc etc - o que já há um bom tempo configura um Regime de Exceção inconstitucional - a mim me parece covardia e omissão inaceitável das Forças Armadas.
ResponderExcluirForam ultrapassados todos os limites por essa ousada esquerda, não pelos tímidos populistas da direita dentro de suas 4 linhas, em que pese eventuais "erros" de condução de suas políticas públicas.
Não lhe parece que estamos caminhando (e quase chegando), sob esse "olímpico" olhar impassível dos militares, no precipício vermelho, à moda venezuelana?
Muito bom e eh exatamente que hoje, mais do que 60% da população pensa e que foi aqui relatada de forma abrangente e transparente. Parabéns Mestre
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