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quarta-feira, 30 de setembro de 2020

ARTE DE ERRAR ATÉ QUANDO ACERTA

 O "revogaço" de Salles, das Resoluções CONAMA 302 e 303, "bombou nas redes" e... nada resolveu

 

Foto:  Anderson Riedel/PR


Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro


A sanha de "bombar nas redes sociais"  para os apoiadores "iniciados", está obstruindo a razão política do governo Bolsonaro.

A vítima da vez é o Ministério do Meio Ambiente e seu Conselho Nacional do Meio Ambiente.  

O Ministro Salles, demonstrou muita pressa de impor um "revogaço" de resoluções no CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente.  Convocou de uma hora para outra uma reunião do Conselho sem atentar para a sensibilidade da pauta. 

O gestor, ao que tudo indica, fez isso  para atender  à demanda de setores aflitos com a indefinição de orientações e  para encerrar a insegurança jurídica que se abatia sobre empreendimentos afetados por restrições ambientais duplamente regradas - pela nova lei florestal e pelas regras infra legais urdidas na vigência da lei anterior. 

Mas a dramatização - que muito agrada aos chamados bolsonaristas, é um vício.  Assim, também tomado pela premência de criar um factoide, o Ministro e seu staff  misturaram meios e fins - fazendo com que o certo saísse errado.  Uma proeza...

Não há outra classificação. Lamentável a forma como foram feitas as coisas. Como se no ministério não houvesse assessoria jurídica, institucional e política. E por óbvio, tem. 

No afã de resolver um conflito, o resultado da ação atabalhoada do ministro foi gerar outro conflito - com o mesmo conflito. 

O caminho certo estava ao alcance da mão. Bastava consultar um vade mecum. Bastava construir uma agenda de discussão pública,  organizar um breve calendário para a revogação paulatina das resoluções - ainda que em curto prazo, sem descurar de eventual novo regramento para o que fosse necessário. Bastava, também, estabelecer normas de transição - tudo como manda a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.

De fato, as Resoluções CONAMA 302 e 303 de 2002, jaziam vagando no mundo normativo como "walking deads" - desconectadas do novo regime legal de florestas. Mereciam uma densa e bem fundamentada  reavaliação diante no novo quadro legal. Assim, em tese, o Ministro e seu Conselho promoveriam um "revogaço"  de normas que de fato estavam revogadas. 

Mas o alerta de Paulo Bessa*, em artigo publicado neste blog, permanece válido: "diferentemente do que, apressadamente, se possa imaginar, a questão não é tranquila. Ao contrário, a jurisprudência judicial é diametralmente oposta à decisão tomada pelo CONAMA". 

Vale dizer - deveria ter tido a cautela na forma para mexer no conteúdo das referidas normas - observando as circunstâncias jurídicas que as envolviam. 

Não tomaram os cuidados e "passaram a boiada". 

No entanto, forma é finalidade no direito público.  

Não há dúvida: a pressa em convocar e decidir atrairá a judicialização e, com ela, a perenização do conflito que se pretendia resolver.

Há problemas nessa revogação. O CONAMA, hoje vinculado ao Ministro, não atentou para os detalhes - e é neles que o diabo mora (e Deus também). 

Dispositivos como o regime de aplicação da área protegida em topo de morro, a proteção de mananciais em áreas urbanas,  o regime de supressão quando o reservatório artificial se destina ao abastecimento, entre outros "detalhes", ficaram pelo meio do caminho. No atropelo de revogar outras normas para favorecer atividades de cogeração, por exemplo, desapareceram os critérios mínimos de liberação dessas atividades de aproveitamento energético.

Mais uma vez, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro foram ignoradas,  e elas determinam que se institua uma forma de transição justamente nessas hipóteses.

Ou seja, os apressados conselheiros do ministro conseguiram tornar a revogação inócua - para desespero do mercado e dos próprios  órgãos de fiscalização.

Agora, é aguardar a lawfare. 


Nota: 

ANTUNES, Paulo Bessa - "A Revogação das Resoluções 302 e 303 de 2002 do CONAMA", in Blog The Eagle View, 30/09/2020 - in https://www.theeagleview.com.br/2020/09/a-revogacao-das-resolucoes-302-e-303-de.html







Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio do escritório Pinheiro Pedro Advogados.  Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa - API.  É Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View". 














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