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quarta-feira, 30 de maio de 2018

O QUE AÍ ESTÁ ACABOU - O QUE FAZER?

Precisamos de outra República e uma nova constituição


Manifestações de junho de 2013 em São Paulo - o fantasma voltou para puxar a perna do regime (foto - uol)



Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro


A greve dos caminhoneiros expôs o pavor instalado no poder e nos meios de comunicação atrelados a ele.  O comportamento errático de todos face à característica difusa da liderança do movimento e interesses afetos ao fenômeno, revelou que a estrutura institucional posta a serviço do governo está falida. Ruiu para muito além do que pode ser resolvido por sufrágio eleitoral, seja qual for o resultado, decisão judicial, lei ordinária ou emprego de forças de segurança. 

O que aí está, definitivamente acabou. É necessário uma república nova.

O que fazer? 


O governo acabou

"Se um homem não sabe a que porto se dirige, nenhum vento lhe será favorável", vaticinara Sêneca, o grande advogado e pensador romano. 

O Brasil segue inteiro nessa nave sem rumo, dirigida por um governo reduzido à inépcia. 

O governo segue perdido, isolado em uma cabine de comando desprovida de instrumentos de navegação. Sem comando, a tripulação tomou o barco de assalto - um motim não declarado. Os amotinados, agora tratam de espoliar os passageiros indefesos - o povo brasileiro. 

É assim que instituições de Estado e grandes grupos econômicos estão se comportando.  Espoliam o país como se o amanhã não existisse.

Estado sem comando se desagrega. Navegando às cegas, o barco onde se encontra a Nação irá colidir nas pedras, deliberadamente,  ainda que o farol cegue os olhos do timoneiro.

Notório que o governo não sabe o que se passa à sua volta. De fato, não há serviço de inteligência que auxilie um governo desprovido dela. Não há moralidade pública que possa ser restabelecida por instituições que não a praticam. Não há justiça que possa ser aplicada por autoridades sem moral. Não há autoridade sem respaldo de uma ordem legal que se cumpra. Não há ordem legal sem constituição que efetivamente a constitua. 


A volta do pêndulo da história


O regime constitucional de 1988 sucumbiu ao seu próprio peso. Escorrega no lodo dos interesses corporativos da mais cara e incompetente máquina burocrática do mundo. Está  atolado na lama das indefinições, sofre com a corrupção, o gigantismo e a paralisação administrativa, enfrenta a desordem jurídica, a falta de planejamento e a criminalidade organizada. 

O pêndulo da história parece alternar o rumo em direção à sístole.  Já há quem pense não haver saída fora de uma ordem imposta por força de instrumentos de exceção. 

Há quem clame pelo resgate da Lei e da Ordem. Não uma ação localizada contra a baderna ocasional, mas que garanta profunda e implacável alteração na estrutura de justiça, de governo e no parlamento.  

O objetivo em causa é comum a várias outras vertentes da sociedade: o resgate do império da Lei, a reposição das normas legais no quadro de garantias sociais e a revogação, "sem choro", das benesses da burocracia estatal.

Esse processo estava na pauta das gigantescas e impressionantes manifestações de julho de  2013, que trouxeram pavor aos poderes de Estado, pois mostraram que o povo não estava mais disposto a tolerar a organização política  que era obrigado a sustentar.

Os conflitos de rua em 2014, também significativos, precederam a goleada germânica de 7X1 na seleção brasileira e enterraram a figura patética da "Pátria de Chuteiras".

As gigantescas manifestações contra o governo Dilma, em 2015, puseram uma pá de cal no projeto de poder esquerdista, livrando o Brasil de seguir o rumo da Venezuela.

Os milhões de cidadãos manifestando-se nas ruas, todos esses anos, deixaram claro o que não queriam. As últimas eleições, de 2016, para os municípios, também explicitaram essa rejeição, pelo voto e pela anulação. 

O quadro revelou "que o rei estava nú", e o manto constitucional mal o cobria, e continua mais curto a cada dia.

Agora, ocorre o apoio popular mudo, porém firme,  à greve dos caminhoneiros, que reafirmou a rejeição ao regime da Nova República.

A verdade é iconoclasta: Do que aí está, nada sobrará. 


O rompimento iminente?

A greve dos caminhoneiros expôs a fraqueza de um sistema que não enxerga rumos e saídas. A mídia atrelada ao grande capital tentou, mas não conseguiu omitir do cidadão o que todos já viam:  a vilania dos hipócritas que deveriam iluminar - e no entanto obscurecem -  a política nacional. 

É preciso mudar, e essa mudança exige transformação.  Só avestruzes morais e urubus ideológicos - parasitas do dinheiro público e do dinheiro alheio, ignoram essa acachapante realidade.

A busca pelo restauro da Ordem pressupõe romper com o regime em vigor. Mas antes que digam que isso seria "antidemocrático", é preciso constatar o óbvio: a democracia é um fenômeno orgânico  que deve preceder a Ordem e moldar o Estado de Direito. 

A democracia é também o  supremo objetivo da união nacional - caso contrário a violência se instala.  

O ideal democrático, no entanto, não se esgota na Ordem constitucional vigente. Muito menos se expressa pela realidade política que vivemos. Também não exclui a admissão, pelos cidadãos, de uma ação legitimadora visando por ordem na casa e sanear o meio, quando se faz necessário. 

Será preciso fazer uma enorme e democrática faxina, para eliminar o lixo populista produzido à esquerda e à direita. Esse lixo teve e tem patrocinador: a vilania rentista que comanda, das sombras, o impressionante processo de concentração de renda na economia nacional.

Será preciso uma ordem que imponha a ferro, fogo e bom senso,  o restabelecimento da dignidade e a construção de uma república nova. Um rumo para a nau do Brasil. 


Transição constitucional

Sem respaldo no tecido social, governo, parlamento e judiciário esgotaram a paciência nacional e demandam reciclagem.

A saída civilizada, democrática, seria uma renúncia coletiva e  convocação de eleições gerais. O novo congresso determinaria a eleição de uma assembleia nacional constituinte e votaria a formação de um governo provisório.

Uma vez convocada, as eleições para a Assembleia deverão implicar em candidaturas totalmente renovadas. Isso porque os que hoje administram os poderes da república, não têm qualquer condição de ministrar remédio para curar o estado de coisas inconstitucional pelo qual passamos, em que constam como agentes. 

Mais outro paradoxo: A ordem constitucional em vigor gerou um estado de coisas inconstitucional, onde o Estado deveria mas não provê defesa, segurança, saúde e educação. Esse estado decorre do fato inegável da realidade brasileira há muito ter transbordado para fora da constituição que deveria regê-la. 

Para dar fim ao estado de coisas inconstitucional que hoje experimentamos, será necessário uma constituinte originária. Para tanto, a ruptura institucional é inevitável.

A partir da quebra da ordem constitucional, que não mais nos serve, construiremos outra. 

Para isso, precisamos de quadros preparados, determinados, à altura da tarefa, e que não se encantem pelo próprio protagonismo.

Maquiavel leciona que ações transformadoras devem ser executadas  rápida e eficazmente.  Ou seja, o processo de ruptura deverá ser breve, ter prazo fixo e conferir poder constituinte originário à uma nova ordem republicana,  - descompromissada (bem como seus atores)  com o lixo burocrático, político, econômico e corporativo que aí está. 

Dessa forma, a ruptura ganhará legitimidade e se consolidará democraticamente.

Teremos homens dignos dessa tarefa? Ou iremos nos deixar enganar, mais uma vez, pelo populista salvador da pátria da esquina?

Nas crises, os líderes se revelam... ou decepcionam.

Até aqui, só decepção. Talvez por sofrermos um mal formatado pelo imobilismo contido em nossa constituição.

O país, de frustração em frustração, caminha para um incêndio. Talvez seja necessário combater fogo com fogo - mas para isso, são precisos coragem, preparo intelectual, planejamento e determinação. 

Teremos isso?

Hora de restaurar a dignidade e repensar o Brasil.


Nota: 
A respeito da sucessão de crises, recomendo ler este artigo: 
A Grande Revolução Digital




Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e da Comissão Nacional de Direito Ambiental do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB. É Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.







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