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quinta-feira, 18 de maio de 2017

BIOLOGIA DA DELAÇÃO

lixo produz lixo que resulta em lixo...que atrai vermes. 


Não se engane, este é o rosto dos delatores


Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro


Não vamos nos iludir.

A delação dos irmãos Batista esconde muito mais do que revela.

Por trás do desastre se encontra a manipulação.

É fato que por esse mecanismo, o da delação, quem contribui pode, pelo visto, até ganhar com a confissão das falcatruas. 


o malfeito não se desnatura com delação


É um dito conhecido no mundo policial: delação premiada não desnatura o malfeitor.  Criminosos jamais deixam de sê-lo pelo fato de contribuírem com a investigação - na verdade, o fazem por justamente serem pré-constituídos.

Segundo  quem trabalha no combate ao crime organizado, A cooptação dos delatores segue a lógica da microbiologia.  Na fisiologia criminológica do parasitismo, vermes delatam por vislumbrarem a esperança de permanecerem parasitando nos mesmos organismos.  A saída, no entanto, é conceder-lhes uma morte menos sofrida -  não uma oportunidade de sobrevivência. Na verdade, o verme, quando sobrevive, contamina o organismo,  se reproduz e produz mais lixo.

Se a autoridade não compreende esse mecanismo biológico, permitirá a reprodução em escala da infestação que deveria extirpar. 

Guardadas as expressões, é o caso exato da delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista... e da crise institucional desastrosa que feriu de morte a república. 

Ao “rifarem” o governo Temer, para terem o que barganhar na investigação de seus malfeitos,  Joesley Batista e seu irmão Wesley adotaram uma estratégia de sobrevivência: garantiram a mudança de sede do grupo JBS para fora do país, se acertaram com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos - onde mantém mais de cinquenta fábricas e frigoríficos, firmaram um outro pé na Europa e, assim,  deram uma "banana" para o Brasil.

Tudo fizeram, como fizeram, da forma que ousaram fazer, com as bênçãos do Supremo Tribunal Federal e do Ministério Público.

Não se trata de um julgamento moral. Trata-se da terrível e perversa lógica do mercado, que não distingue certo do errado quando a própria economia trata de abolir essa fronteira da ética.


Conversa de goiano


Criado em Goiás, não tive dificuldade em entender a "conversa mole" de Joesley Batista com o Presidente da República. Porém, duvido que o ouvido "paulista" do Temer tenha compreendido metade do que ele disse...

O goiano fala "tudu encarriado", juntando um vagão com o outro, e variando a sonoridade. Na malfadada gravação, divulgada atabalhoadamente pela Rede Globo de Televisão,  aquela que tudo insinua e nada prova, fica claro que o delator foi lá para contar histórias... uma atrás da outra, falando baixinho com quem devia estar do outro lado da mesa de despacho ou na poltrona oposta à mesa de centro da sala... (afinal, o eco na gravação comprova que o interlocutor estava distante).

Joesley bancou o pescador de águas turvas. Copiou outro delator, o imoral Sérgio Machado, que aliás ele cita na conversa. Foi visitar o presidente ao que tudo indica sem ser chamado, ou chamado na sorrelfa.  Porém, sua intenção obviamente dissimulada era mesmo pescar....

Contou um monte de lamúrias... jogou iscas... e  Temer, que é educado, deu uma de "yes man" - aquele indivíduo que ouve o outro e assente com tudo por cortesia, para não polemizar e perder tempo - típico de quem quer ser cordial porém breve...

Só um mal intencionado poderia extrair alguma trama ou outro tipo de bobagem dessa conversa. O episódio da tal "ajuda ao Eduardo"... então... chegou a ser inaudível.

Bernard Shaw, o grande teatrólogo inglês, visando defender sua tese de que anfitriões, por educação, sempre ignoram o que o visitante diz, ao ser recepcionado por uma nobre britânica, um pouco atrasado, justificou-se dizendo que  "estava matando a sogra e, como ela tinha um pescoço duro, havia demorado para morrer", no que a atenciosa hostess respondeu: "não importa, Mr. Shaw, o importante é que o senhor tenha vindo"...

Seria a dama uma criminosa...por ouvir sem atentar?

No entanto, o material foi colhido e apresentado como meio de obtenção de prova - vale dizer, isoladamente nada significa, a não ser uma dor de cabeça de caráter político.

Pelo visto era isso que queriam os tomadores da delação. Um aríete de caráter político, embora juridicamente imprestável e moralmente questionável.



Prova ou indício?



A colaboração premiada possui natureza jurídica de "meio de obtenção de prova" (art. 3º, I, da Lei nº 12.850/2013).  Importante entender esse fato. 

A colaboração premiada não é um meio de prova propriamente dito.  Ela não prova nada (não é  prova, é meio para obter uma prova). A colaboração premiada, portanto, é instrumento técnico para a busca dos meios probatórios. 

O detalhe é importante para que o leitor entenda o porquê de parte das delações dos irmãos Batista terem vindo acompanhadas das provas produzidas com autorização judicial - pois elas, por si - nada provariam.  Fizeram tudo o que fizeram para tornar as delações eficazes.

Porém, é preciso mesmo assim discriminar o que restou provado e o que resultou em mero indício... e com que finalidade foi produzido.

Pois é justamente aí que reside o problema.  A finalidade não corresponde ao objetivo da investigação e a boa técnica não poderia servir a finalidade diversa da investigação. Ao que tudo indica, o meio de obtenção de prova colhido foi parcial.

Aliás, que autoridade decente iria autorizar o meio de colheita de prova "em aberto" - sem especificação alguma do que se queria obter - perante o Presidente da República?  Se autorizada tamanha barbaridade, é caso de responsabilização de quem levianamente autorizou.

Se assim o foi - e isso ainda pode mudar no decorrer da sucessão de fatos, bem entendido - o mecanismo do judiciário pode ter servido, espera-se que involuntariamente, para atender a uma canalhice maior ainda que a delatada. Senão vejamos:


Manipulação do mercado


O mercado financeiro estava  em pânico, com o avanço das investigações sobre o envolvimento de bancos e corretoras autônomas de investimento na lavagem dos bilhões movimentados pela propinocracia instalada no país.  E nesse campo a Operação Lava Jato estava surpreendendo.  

No entanto, a ação da equipe econômica de Temer havia estabilizado o dólar, com avaliações positivas sobre a aprovação das reformas - conseguindo até mesmo que operadoras desbancarizadas fossem compradas a peso de ouro por bancos, para estancar sangrias no mercado. 

Dois estamentos estavam incomodados com isso: a jusburocracia - ameaçada pelo questionamento de suas benesses com a reforma da previdência e... os canalhas da república, acuados pelas investigações e sem perspectivas para especulações. 

Restava açambarcar os bilhões retidos em contas de offshores no exterior, na Ásia e América Latina.

Era necessário, ainda, concluir os processos que reduziriam a capacidade de reação política do lulopetismo  e avançar na limpeza do ambiente político-jusburocrático com as demais operações coligadas.

Eis que então, "do nada", surge a delação dos irmãos Batista e todo o aparato investigativo por elas induzido muda de foco. 

Com o fato "as máscaras caíram" - do atual presidente da república aos tucanos que lhe davam apoio... não sobrou nem uma nesga de dignidade face às provas produzidas.  

Isso foi muito bom! O fato é uma alvissara para todo cidadão que pretende ver o Brasil livre dos parasitas que o corroem, seja de que lado for.

No entanto, às vésperas do vazamento das delações dos irmãos Batista e desencadeamento da nova operação da Polícia Federal, a JBS - de propriedade dos delatores, comprou dólares no mercado de câmbio... e em grandes quantidades.

Isso foi ruim! Revelou que o pivô da crise se sentia desobrigado para com os fatos - algo típico de quem se sente impune e livre para participar como ator no próximo ato. Mais uma vez, a regra de mercado amoral sobrepondo-se a uma economia combalida e desprovida de sentido. 

A JBS, dos irmãos Batista, cresceu dezessete vezes durante o governo Lula e espraiou-se para fora do país. Com a injeção de divisas efetuada pelo tesouro brasileiro, via BNDES, irá gerar divisas lá fora, e será lá fora que o  contrato de cambio especulativo, em cima da desestabilização produzida, irá gerar seu lucro.

Pela lógica dos fatos, o Brasil, ficará com o lixo produzido pelos imbróglios, e a JBS, ficará com os dólares - tudo abençoado pelo Ministro Fachin e o PGR Janot.

A delação parece ter consolidado a república canalha, o regime dos delatores, em detrimento do Brasil.

Temer é mera peça nesse jogo de bilhões...


Cadê o dinheiro? 


Sem qualquer amarra econômica - onde a norma faz  a razão moral da administração dos recursos, o mercado - por natureza amoral, dispara.  Foi nessa janela que o gigantismo se impôs no mercado frigorífico. Os empresários goianos, com o gigante que criaram,  praticamente engoliram o mercado de carnes brasileiro, e o fizeram com a ajuda do governo Lula. Organizaram um forte marketing, transformando até o vegetariano Roberto Carlos em um neo-carnívoro. Envolveram-se no escândalo mundial de adulteração de selos e viram-se enrolados no caso de corrupção de fiscais da vigilância sanitária (que quase pôs a pique a balança de exportações brasileira). Foram pegos na última operação da Polícia Federal com relação ao favorecimento explícito na obtenção de dinheiro do BNDES - na ordem de bilhões - perdendo méritos que poderiam ter na alavancagem que empreenderam nos negócios. Ao fim e ao cabo, saíram do país em uma carreira documentada em filmagem,  com as bençãos do Supremo Tribunal Federal, e o fizeram usando a lógica do mercado,  para lucrar com a crise que de certa forma promoveram. 

Os delatores,  ao que parece, protegeram aliados lulo-petistas e, de quebra, incentivaram a militância de esquerda a tornar a abrir a boca.  O movimento pareceu querer destruir a outra metade podre da mesma fruta que  todos, ali, comeram...

Patente que um volume impressionante de dinheiro financiado pelo povo brasileiro permaneceu intacto, e suspeita-se que também nas contas não reveladas, permitindo  manipulação de resultados  na Operação Lava-Jato,  com lucro nessas manobras, senão vejamos: 

Percebendo que as investigações  revelavam um castelo de cartas marcadas, os irmãos Wesley e Joesley Batista se adiantaram, antes que fossem presos, para organizar uma delação. No entanto, não perderam a oportunidade de obter a melhor premiação possível para o que iriam revelar. Assim, negociaram e obtiveram sua imunidade - mesmo porque, a partir daquele momento, estariam eles próprios na alça de mira de múltiplos incomodados.

Resolveram, porém, ao que tudo indica, escolher  destruir um lado para preservar o outro. Pouparam os petistas que lhes concederam financiamentos bilionários em suas gestões e não pouparam os demais canalhas instalados no poder, que também foram beber da mesma fonte.

Tudo ainda pode mudar... mas os indícios divulgados na imprensa e transmitidos pelas movimentações da polícia circunscrevem  a delação dos irmãos Batista à banda podre instalada no governo Temer. Parece que o rol de revelações não desceu aos detalhes sórdidos das parcerias montadas no governo Lula-Dilma,  cujo butim petista se encontra, provavelmente, homiziado nos paraísos fiscais e gordas contas bancárias em Cingapura, HongKong e Cidade do Panamá.


Algo está faltando... 


Há, nessa manobra, um vácuo de dezenas de bilhões de dólares - quantia suficiente para refundar o Brasil. 

Talvez seja exatamente isso o que pretendiam os irmãos Batista acobertar com suas omissões. Poupar petistas  beneficiados pela "meia-delação", para talvez  refundar o Brasil num segundo momento. 

Mas a pantomima não engana ninguém - só revolta. A extensão de envolvidos, ao que tudo indica, transcende o executivo e o legislativo - irá chegar ao judiciário.  

A sensação de impunidade decorrente dessa meia verdade delatada pelos irmãos Batista, somada às decisões absurdas de libertar Zé Dirceu e cia, põe o Supremo Tribunal Federal de novo na berlinda - torna-o diretamente responsável pelo escárnio promovido com a compra de dólares às vésperas da explosão do escândalo que  a beneficiária da  própria compra promoveu - um lance de especulação de mercado que daria décadas de prisão em regime fechado em qualquer país sério do mundo.

Como já tive oportunidade de comentar quando da famosa "Lista de Janot/Fachin", a generalização é  juridicamente injusta, politicamente desastrosa e institucionalmente desmoralizadora. Parece que os insignes magistrados da suprema côrte estão fazendo uso dos "ganhos morais" obtidos pelo intenso combate à corrupção encetado na primeira instância para, com eles, manipular resultados e atacar a própria estrutura que suporta esse mesmo combate.  

É essa cumplicidade sórdida que permite, também, que os militontos zumbis da esquerdalha pútrida, apeada do poder com o impeachment de Dilma, saiam das tumbas para  protagonizar nas ruas algo parecido com "a volta dos que nunca foram"...


Pensaram que todos eram idiotas


Ao que tudo indica, não foi uma "delação", foi uma conspiração contra a República.

Agiram todos os envolvidos no embrulho procedimental como se o povo brasileiro fosse idiota... incluso os demais operadores do direito.

É de uma obviedade ululante que Joesley "procurou" a PGR em Brasília orientado a se antecipar às medidas de restrição que partiriam de Curitiba - na alçada do Juiz Moro.

Como não poderia chegar na instância superior de mãos abanando... foi orientado a "armar" a gravação com Temer e a ligação telefônica com o Senador Aécio - pois desta forma ficaria "livre" das garras da Força-Tarefa da primeira instância (que já estava fustigando as atividades predatórias da JBS).

Assim, "de quebra",  os irmãos atropelaram a força-tarefa da Lava-Jato na primeira instância e acertaram os ponteiros com a  PGR e STF, em Brasília. Uma vez ali,  parece que se escolheu o que deveria ir para a mídia e retardar o que deveria ser remetido a Curitiba - fatos que seriam da alçada do Juiz Moro - seguindo o raciocínio torto de fatiamento da investigação elaborado pelo próprio STF.

O procedimento adotado - do ponto de vista da estratégia de defesa, foi "brilhante", e difere totalmente do adotado com a ODEBRECHT, incluso a  FUGA  permitida à dupla da JBS e seus executivos.

Saíram os delatores do país, é bom sempre repetir, com os bens, o dinheiro, os segredos das "parcerias e sociedades" com os próceres do PT - suspeitadas de há muito, e as contas secretas relativas aos bilhões em paraísos fiscais - que desta forma ainda servirão para financiar a campanha lulopetista de reconquista da república.

Fizeram tudo de uma penada, em poucas semanas, em período dez vezes inferior ao que os procuradores da força tarefa demoraram para colher a delação da Odebrecht, da UCT, da OAS, da Engevix... e, de quebra, deixaram como uma "linguiça aos cães"  a gravação manipulada de Temer.

Como se diz em Goiás - Temer serviu de "boi de piranha", para sangrar a jusante enquanto toda a boiada passava a montante pelo riacho do STF.

Não se está lidando, aqui, com amadores ou gente pacífica.

Resta saber se a PGR e o STF foram meras peças úteis ou... co-protagonistas do esquema.



Hora de desinfetar a República


Não devemos nos iludir. A delação dos donos da JBS pode estar escondendo muito mais que revelando.

Como já dito em vários outros artigos.  Ainda que se possa promover uma transição de poder na crise - nos moldes constitucionais, elegendo um presidente em mandato provisório, não haverá saída a médio prazo que não passe pela ruptura institucional e desinfecção radical  das instituições da república e amputação dos organismos comprometidos. 

É preciso não apenas cassar... mas, sim, caçar todos os canalhas, desentocar as ratazanas e exterminar os vermes, para o bem do Brasil. 


Leia também:
"Cliente Morto não Paga" e a "lista de Fachin"
* Nada do Que Foi Será...
* Colaboração Premiada e a República dos Delatores




Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e das Comissões de Política Criminal e Infraestrutura da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB/SP. É Vice-Presidente da Associação Paulista de imprensa - API, Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.






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