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quinta-feira, 2 de março de 2017

JUSTIÇA QUE DÁ TRABALHO E CUSTA CARO

Montado em uma legislação ultrapassada e inútil, o judiciário trabalhista não diz em números a que veio... Mais uma bastilha a ser derrubada na restauração da República.






Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro


Deu no Estadão: O Brasil conseguiu abocanhar mais um título para a sua extensa lista de conquistas negativas. Com cerca de 2 milhões de processos por ano, o país é campeão mundial em ações trabalhistas.



Um prêmio à estupidez

Segundo levantamento do sociólogo José Pastore, especialista em relações do trabalho há mais de 40 anos, o Brasil não encontra paralelo no mundo em termos de conflitos trabalhistas judicializados. Nos Estados Unidos o número de processos não passa de 75 mil; na França, 70 mil; e no Japão, 2,5 mil processos.

Ou seja, com 2% dos trabalhadores do planeta, o Brasil responde por 98% das ações trabalhistas em curso no globo terrestre...

Um prêmio à estupidez coletiva que só nos envergonha.

Por óbvio que não se trata de uma questão cultural.  O problema é estrutural, ideológico e econômico. 



Legislação anacrônica

De fato, possuímos uma estrutura legal que não tutela qualquer relação dinâmica compatível com nossa economia.

Temos leis anacrônicas que não se aplicam à nossa realidade social, cultural e econômica. Leis que estimulam a fuga de capitais, instituem expedientes de arrecadação voraz e germinam fraudes e corrupção. Afugentam empregados e patrões da pretensa formalidade que deveria tutelar suas relações. 

Na opinião de especialistas, o quadro caótico é resultado de inúmeras falhas, mas a principal é com certeza a anacrônica, falha, irreal e ideologizada legislação trabalhista.

Em apoio aos marcos legais jurássicos, segue-se paquidérmica e parasitária jusburocracia e seus penduricalhos, que vampirizam a economia nacional. 

“Quando vejo 2 milhões de ações na Justiça, começo a achar que há alguma inadequação na nossa lei, que não foi feita para um mundo moderno, globalizado. O elevado número de ações não é um bom sintoma”, avalia o advogado Almir Pazzianotto,  ex-ministro  do Trabalho e  ministro aposentado do Tribunal Superior do Trabalho. Para  Pazzianotto, houve uma "banalização da Justiça do Trabalho no Brasil. Qualquer coisa é motivo para entrar com um processo trabalhista".

As mudanças urgem, pois o sistema, além de estruturalmente falido e institucionalmente desmoralizado, financeiramente não se justifica.

De há muito deveria ter sido adotado o mecanismo de conciliação extrajudicial, como arbitragem e conciliação prévia -  para a resolução de conflitos contratuais trabalhistas.

Aliás, mecanismos alternativos foram tentados em vários momentos, desde a instituição da mediação e arbitragem no país. Foram, porém, boicotados pela jusburocracia trabalhista. Não se coadunam com a legislação obsoleta, sindicatos aparelhados pela esquerda, federações patronais parasitas e demais segmentos que sobrevivem da contribuição sindical, dos recursos advindos do fundo de garantia por tempo de serviço,  das rescisões trabalhistas cartoriais e da massa de contencioso na Justiça do Trabalho.

“Esses mecanismos estão evoluindo de maneira muito lenta. Mas acredito que uma hora as pessoas vão se dar conta de que esse é o melhor caminho contra a morosidade”, afirmou Pazzianotto ao Estadão.

O jurista em causa pode esperar sentado. Se depender das reações no campo da política e da justiça, nada sairá do lugar... até ruir em colapso.

Somente cegos e hipócritas não enxergam a disfuncionalidade legal vivida por nossas relações de trabalho.

Porém, a cegueira e hipocrisia são  politicamente premiadas, porque adequadas à postura ideológica prevalente na jusburocracia - mantida por essa estrutura legal. 



Instituições comprometidas com o desastre

A jusburocracia é parasitária. Envolve sindicatos, federações, centrais, fundações, institutos, associações profissionais, partidos políticos, profissionais peritos, operadores jurídicos e fiscais, cada vez mais dedicados à manutenção de seus nichos de mercado, seus cartórios e privilégios.  

A ideologia estatocrata que domina todo esse ecossistema institucional, parasita e simbiótico, é pretensamente esquerdizóide. Mas, no fundo, permanece fascista. Revela o cenário patético da tragédia burocrática brasileira. Instituições comprometidas com o desastre.



Justiça cara e paquidérmica

O fruto desse metabolismo fisiológico é o caro e inútil judiciário trabalhista.

Não há qualquer justificativa meritória ou catastrófica para o fato: A justiça do trabalho brasileira custa ao cidadão cinco vezes o volume de verbas que consegue arrecadar para devolver aos que a dela se socorrem. 

Os dados estão à mostra no Relatório Geral da Justiça do Trabalho - graças à ação de transparência do Conselho Nacional de Justiça.  

A Justiça do Trabalho concentra 21% dos gastos do judiciário brasileiro. Em 2015 o segmento apresentou despesa de R$ 17,1 bilhões -  um custo de 86 reais por habitante no Brasil, ou quase 3% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Desse valor impressionante, 93,5% foram  para despesas com recursos humanos – sendo 97%  só com magistrados e servidores e 3% com o pagamento de terceirizados e estagiários. 

O colosso burocrático arrecadou, no mesmo ano de 2015, perto de 3 bilhões em custas, emolumentos, taxas, execução previdenciária e penalidades impostas. Pífios 19%  da  verba que consome, extraída do cidadão contribuinte. 



Mas o desastre não para aí 

No ano de 2015, a Justiça do Trabalho auferiu em favor daqueles que a procuraram para resolver suas pendências com os patrões, uma quantia quase igual ao seu custeio. Ou seja, "empatou o marcador"...

Tirando, porém, os grandes casos de reclamações em massa ou grandes indenizações isoladas, o resultado desequilibra e a média de pagamentos não vence o custo da máquina, tendo-se em conta que cada ação ajuizada custa ao tesouro algo próximo de 3,4 mil reais. 

Vamos esmiuçar esse varejo seguindo o cálculo de José Pastore para o Estadão: para cada mil reais julgados, a Justiça do Trabalho custa ao cidadão contribuinte mil e trezentos reais. Ou seja, o brasileiro literalmente paga para manter um judiciário que pouco lhe devolve.



Suntuosidade, arrogância e frustração

Se somarmos o fato do judiciário trabalhista construir palácios suntuosos com a mesma dedicação com que sua burocracia distribui grosserias e arrogâncias aos incautos que a procuram - partes, prepostos, advogados, testemunhas, o resultado, além de revoltante, é desalentador.

Não é a toa que o caríssimo fórum trabalhista de São Paulo, por exemplo, detém o recorde impressionante de suicídios praticados em suas instalações, em relação a toda a geografia da cidade. O ambiente ali é merecedor de profundo estudo psico-comportamental...

O volume de conflitos mal resolvidos pela imensa máquina burocrática só é superado pelo volume de contradições e deficiências meta-burocráticos por ela produzidos.

Segundo se sabe, uma ação trabalhista, no Brasil, superada a conciliação, se nenhum outro incidente ocorrer, levará em média sete anos para ser julgada e, no mínimo, mais três anos para que sua execução seja satisfeita. Ante esse simulacro de acordo  bíblico entre "Labão e Jacó", a saída sistemática é o achatamento dos valores devidos em juízo, por meio de forçosas conciliações na primeira instância - o mau acordo é a melhor saída para partes, juízes e advogados, mas que não se traduz nem de longe em "justiça". 



Na outra ponta a mesma ponta...

Na outra ponta do problema, está o mesmo problema: a enorme carga tributária necessária para sustentar uma máquina burocrática monstruosa, que custa mais de um bilhão de reais por dia ao contribuinte brasileiro...

Não por outro motivo, a resposta institucional do cidadão comum é buscar a informalidade. “Hoje muitas pessoas trabalham sem registro por causa da elevada carga tributária sobre os salários”, afirma Almir Pazzianotto.

A informalidade, no entanto, não é um fenômeno infracional ou criminológico. É evidente manifestação de desobediência civil. 

Corporações e organismos estatais contratantes, por conta do compliance, têm desenvolvido exigências de solução de passivos trabalhistas à manutenção de contratos com seus fornecedores. No entanto, esse fenômeno de "compliance de formulário" gera "metaburocracia" e os resultados revelam-se ainda mais perversos. Estreitam canais de contratação que deveriam oxigenar a economia cambaleante e não sufocá-la ainda mais.



A falência do Estado brasileiro 

Isso tudo não pode ser visto isoladamente. As estruturas burocráticas instaladas nos três poderes da República brasileira estão sugando vorazmente os recursos públicos e massacrando o cidadão contribuinte.

Essas estruturas carcomidas, ineficazes, caras e meta burocráticas, são as novas saúvas do Brasil: ou acabamos com elas, ou elas acabam com o País.

A Justiça do Trabalho, portanto, não é justiça e não representa o trabalho. É apenas mais uma masmorra burocrática que consome o cidadão brasileiro e o mantém preso a grilhões normativos podres e torturantes. 

O povo brasileiro está diante de mais uma "bastilha" a ser derrubada.

Com esses números catastróficos, a sociedade civil não verá outra saída senão esmagar o ogro burocrático, destruir seus palácios e  despejar o entulho nos bota-foras da República restaurada. 


Fontes: 
- http://www.apcefpi.org.br/portal/pi/informacoes/artigos/brasil-e-o-numero-um-do-mundo-em-acoes-trabalhistas.htm#sthash.TR1ZsoA7.dpuf
- http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/80430-justica-do-trabalho-aumenta-produtividade-e-tem-alto-grau-de-virtualizacao
- http://www.tst.jus.br/documents/10157/11677987/Indicadores.pdf




Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP) e jornalista. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Membro do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB, das Comissões de Política Criminal e de Infraestrutura da OAB/SP. É membro do Conselho da União Brasileira de Advocacia Ambiental, Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa – API, Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.






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