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terça-feira, 19 de julho de 2016

DITADURA DA TOGA SOBRE O WHATSAPP... FERE O BRASIL

O Estado, agora, teme a comunicação digital






Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro


O judiciário brasileiro sente-se acossado pela descrença popular que sobre ele recai. Esse desprestígio também se abate como um todo sobre o establishment. 

Embora o dispositivo econômico e burocrático exerça amplo domínio sobre a mídia formal e analógica, sua influência é bastante reduzida sobre o "boca-a-boca" digital produzido pelas redes sociais. 

As redes sociais, não por outro motivo, encontram-se no limiar de um aparelhamento perverso, seja por ação deliberada de organizações profissionais empenhadas em produzir desinformação, seja por parte de grupos estruturados para exercer censura ideológica na "checagem de fatos", a serviço das empresas que dominam o cartel das grandes redes sociais - todos engajados na linha de "controle moral" da massa de usuários. 

Porém, há um gravíssimo precedente sendo aberto no outro polo desta equação podre e sem incógnitas: a judicialização da comunicação por aplicativos. Isso é forma de reprimir a expressão popular e a cidadania a pretexto de tutelar imagens e direitos.

A ponta do iceberg está no varejo de processos ordinários civis e criminais. Por conta de um conflito interpessoal nos autos de um determinado processo, ordens de interrupção por atacado dos serviços atingem milhões de indeterminados cidadãos, que sofrem prejuízo.

A situação fatalmente vai se agravar  Por uma diferença idiossincrática com a postura ideológica do internauta da esquina, esmaga-se a livre expressão, impondo-se uma censura "do bem" - hipócrita e descarada. 

O "politicamente correto", na sanha de buscar correção de posturas nas redes sociais, escolhe onde, como e contra quem rasgar a lei e manipular a ordem legal vigente, como se a inquisição retornasse dos livros da história para ganhar ares de modernidade digital.

Está se tornando comum, por exemplo, a prática de magistrados, a pedido de promotores de justiça, bloquearem o funcionamento de aplicativos de comunicação em rede nos sistemas de telefonia celular e internet, geralmente por desobediência ou resistência em fornecer dados de usuários ou registro de conversas. No entanto, em vez de punir a empresa desobediente, enquadrando seus responsáveis por crime de desobediência, resolve-se punir todo mundo com uma inócua (para o caso) suspensão do serviço, cuja única eficácia é transtornar quem nada tem a ver com o delito.

A criminalização de condutas ideológicas não consensuadas com o establishment é  exemplo da grande distorção. A decisão judicial passa por verdadeiras ginásticas hermenêuticas e contorcionismos  teleológicos e exegéticos, para reprimir e prejudicar quem "pensa diferente" da  concepção  democrática do plantonista de toga. De outro lado, a perversão moral e a militância explícita em favor da "vida louca", e da nova "cultura do cancelamento" de personalidades nas redes sociais, corre absolutamente livre e solta. 

A supressão  reiterada do direito de milhões de fazer uso das redes sociais e aplicativos de comunicação em rede, a pretexto de "punir o aplicativo pelo não fornecimento de dados",  se enquadra exatamente nesses casos - sendo patente a inocuidade da medida para a finalidade almejada pela autoridade que a determinou.

O Partido Popular Socialista - PPS, recentemente, em boa hora, resolveu adotar uma medida contra decisão recente na esfera do judiciário do Estado do Rio, que resolveu suspender o funcionamento do whatsapp por conta de um litígio interpessoal. O partido o fez atropelando acertadamente o Tribunal carioca: foi direto ao Supremo, que concedeu, provisoriamente, a liminar, liberando o serviço. 

Porém, o próprio STF guarda surpresas  na prática do ativismo judicial. A boca pequena, essa péssima judicatura enxerga na coação judicial uma oportunidade para instituir sistema de "autocensura" consensuada com direções aparelhadas das redes de aplicativos. 

Quando festejaram o "Marco Civil da Internet", muitos de nós alertamos para o risco do mau uso do mecanismo, justamente por quem deveria protegê-lo. O resultado aí está: a caneta sem freio baixa a ripa e solta a tinta virtualmente no teclado.

O avanço da chamada "nova direita" na Europa e nos EUA, paripassu com o crescimento do populismo esquerdista nos países latino-americanos, tem gerado uma poluição de distorções e posturas ofensivas, nos meios de comunicação.  Essa poluição tem um objetivo:  nublar as novas primaveras políticas que fizeram e fazem uso das redes sociais como via de articulação contra governos.  

A somatória de precedentes atinge a liberdade de expressão a pretexto de defendê-la - um perigoso paradoxo.

Próceres da carcomida "Nova República", é fato,  resolveram partir para a sintomática "carteirada digital". Querem intimidar uma população que não mais reconhece autoridade  no que aí está. Não por outro motivo, elegeram os sistemas de comunicação digital como o novo Inimigo do Estado. Tratam de "conduzir forte censura por meio de agências de "fact check" e decisões judiciais arbitrárias.

Há data e hora para início dessa escalada do exercício da tirania sob um "pretexto justo", que tornou-se obsessão no Brasil. A síndrome surgiu após o grande susto das manifestações populares ocorridas em junho de 2013.
 
Claro que há pretextos justos para atitudes injustas. Como diz Esopo, todo tirano usa de um pretexto justo para exercer sua tirania. Assim, a repressão devida a quem ameaça terceiros, difama, injuria, calunia e prega o racismo e o ódio ideológico serve  para a perseguição a cidadãos que pensam diferente, com consequências funestas para todo o sistema de intercomunicação que atende a milhões de usuários. 

Quando a ação avança sobre sistemas de aplicativos destinados à comunicação interpessoal, institui-se uma censura de rede similar ao "grande irmão" orwelliano.  E ainda se justifica a monstruosidade informando que é "para o bem da democracia"...

A pretensão é risível, não fosse trágica pelo espectro totalitário que  dela emana. Seria algo similar a pôr um juiz togado, ou um policial fardado no meio das rodas de amigos ou na mesa de jantar, durante a conversa em família, dentro de casa. 

Os zumbis analógicos da burocracia digital não compreenderam, até hoje, que essas funcionalidades eletrônicas otimizaram barbaramente a mobilidade e a intercomunicabilidade, mas de forma alguma desnaturaram o caráter íntimo e privado do que se transmite nas conversas e bate-papo virtuais entre familiares, amigos e conhecidos - ainda que seja para falar mal do governo. 

Mas a burocracia é persistente. O tráfego de "fake news" por meio de conversas telefônicas via aplicativos, tem sido abordado por canalhas investidos em cargos de autoridade - que pretendem fazer do subjetivo conceito de "uso indevido", um mote para reprimir grupos de usuários, jornalistas e militantes críticos - em especial nos períodos eleitorais. 

Em verdade, está em curso uma pantomima institucional.  A jusburocracia irá fazer cara feia para a platéia, distribuir carteiradas e intimidar o cidadão comum a não fazer críticas a autoridades - autoridades essas que uma pessoa de bem, hoje,  não confiaria a guarda de um pirulito. 

O Estado teme, agora, o WhatsApp... e o  resultado do temor é uma protoditadura.

Abaixo a ditadura da caneta!







Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados, integra o Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional. Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB, membro da Comissão de Infraestrutura e Sustentabilidade e da Comissão de Política Criminal e Penitenciária da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo (OAB/SP). Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal. Responde pelo blog The Eagle View.




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